Televisão não é só BBB
e Domingão do Faustão. Não sei se as graças a isso devem ser dadas a Deus ou a
algum raríssimo programador inteligente, mas o fato é que basta deixar de lado
um pouquinho a preguiça e passear pelos diversos canais que sempre haverá a
oportunidade de se deparar com algo que valha a pena o afundamento no sofá que
você está protagonizando ali, em frente ao aparelho de televisão da sala.
Noite dessas, por
exemplo, aconteceu de eu dar de cara com a escritora Adélia Prado, essa nossa
sumidade nacional na literatura e na arte do raciocínio perfumado com o bom
senso e com a elegância e o frescor do pensamento. O programa, na TV Câmara
(Federal) transmitia o bate-papo que ela
protagonizou dentro da programação da segunda edição do Festival Literário de
Araxá, o Fliaraxá, realizado na cidade mineira em setembro do ano passado. O
aparente distanciamento de meses entre o evento e a transmissão foi plenamente
justificado pela atualidade das palavras da escritora-pensadora, sempre atenta
às nuances que regem a vida em seu tempo.
“O mundo está doente.
As pessoas estão adoecendo”, sentenciou Adélia, mesclando a doçura da forma de
dizer com a contundência daquilo que dizia. Adélia tem percebido, pelas
conversas que capta das pessoas em seu entorno (“ao celular, nas filas, nos
ambientes de trabalho e domésticos”), que o foco das preocupações do cotidiano
são as questões práticas, na maioria das vezes, visando ao lucro material. “As
pessoas, no mundo todo, não dispõem mais de tempo para si próprias e nem para
os outros. Não dão mais importância para o lúdico, para o humano, para a
espiritualidade, para a formação cultural pessoal, para o cultivo do Belo”.
Adélia Prado atribui a
disseminação dessa doença à crescente ausência do aspecto feminino na sociedade
moderna, porque, segundo ela, a essência do feminino é justamente o cultivo da
mansidão, da doçura do ser, do olhar zeloso para si mesmo e para o outro e, por
conseguinte, para tudo o que compõe o mundo. Profundas palavras e sábia
reflexão para os dias em torno do recém passado 8 de março, em que se celebra o
Dia Internacional da Mulher, data que deveria servir para pensar bem mais a
fundo naquilo que a autora propõe, bem além da entrega de flores e de cartões.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 12 de março de 2014)
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