Para mim, até ontem, a palavra
“coxinha” estava restrita ao vocabulário gastronômico básico e à anatomia
humana e animal. No supermercado, a “coxinha” constante na lista de compras
orientava meus passos até a seção das carnes congeladas, onde eu me colocava a
escolher a bandeja com as melhores peças de coxas de galinha a serem posteriormente
temperadas com salvia e arremessadas primeiro para dentro do forno elétrico e
depois para o interior dos estômagos de anfitriões e convidados para o jantar.
Nos lançamentos de livros a que
compareço, nas vernissages e nas festas de aniversário, contentava-me em ligar
o radar e detectar com rapidez as bandejas repletas de saborosos salgadinhos
denominados “coxinhas”, que fazem bonito ao lado de croquetes, pasteizinhos,
canoinhas, sanduíches abertos e assemelhados. Meu afilhado de quase dois
aninhos tem “coxinhas” brancas predispostas a receber beliscões amorosos de
toda a família e pronto, é isso: coxinha é coxinha.
Ou melhor, era apenas isso, até ontem, quando
fiquei sabendo que, agora, “coxinha” se transformou também em termo para
designar um determinado tipo de pessoa cujo perfil prioriza um visual
arrumadinho, comportamento certinho, roupinha lisinha, coisas assim. Tem pessoas,
então, que são “coxinhas completas”. “Sujeito é um coxinha”, me disseram.
“Hãn?”, exclamei eu, deixando em suspenso no ar, entre o prato e a boca, um
pedaço de croquete durante o coquetel (já havia me fartado de coxinhas, àquela
altura).
Não sei exatamente quais são os
aspectos que caracterizam um “coxinha”, apesar de ter descoberto que eles andam
circulando à solta por aí. Quero crer que são assemelhados aos antigos “mauricinhos”
de alguns anos atrás, que, por sua vez, eram derivações dos “playboys” dos anos
1970 e dos “janotas” da geração dos meus pais. Pesquisando no dicionário, inteirei-me
que esses seres são também conhecidos como os “engomadinhos”, ou os “filhinhos
de papai”, bem como os “gramenhos”, os “caretas” e os “pisa-flores” (este
último eu nunca tinha ouvido, mas achei a designação mais poética de todas).
O fato é que se faz necessário
estar sempre ligado na evolução das gírias sociais, a fim de evitar gafes
terríveis como sussurrar num evento algo do tipo “nossa, que desejo que estou
por essa coxinha ali”, lançando olhares para a bandeja do garçom enquanto seu
interlocutor olha desconfiado para você e para o engomadinho da festa... Atualize-se.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 10 de março de 2014)
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