Nas
muitas vezes em que levo meus olhos a passear pelas estantes das livrarias,
deixo eles se divertirem um pouco naquelas seções em que os livreiros amontoam
os livros pertencentes a uma espécie muito estranha de literatura. Tratam-se
daquelas obras concebidas com a pretensão de ajudar a organizar alguns aspectos
de nossas vidas, orientando interesses e economizando esforços de busca.
Normalmente,
os títulos desses livros dizem assim: “Cem filmes para assistir antes de
morrer”, “150 livros para ler antes de morrer”, “200 lugares para conhecer
antes de morrer”, “Os cem maiores escritores da Lapônia”, “As 100 melhores
receitas de cachorro-quente”, “300 receitas para preparar para sua namorada”,
“20 receitas para preparar para sua esposa”, “Mil receitas para preparar para
sua amante”, “As 100 receitas que você não preparará para sua ex”, “Trinta
receitas para forçar que ela o deixe”, “Como ficar rico em 10 lições”, “Como
conquistar quem você quiser e como se livrar depois”, “Os 90 livros que você
deveria ter lido mas que jamais lerá” e assim por diante.
Deixo
meus olhos circularem pelos títulos e, dependendo do caso, até permito que
minhas mãos entrem na jogada e retirem algum exemplar da prateleira para
folheá-lo e fornecer, assim, aos olhos, uma ideia mais ampla do conteúdo ali
impresso. Mas nunca permito a participação de meu bolso nesse processo. Não os
compro. E não por preconceito bobo ou por soberba, altivez, esnobismo. É por
medo mesmo.
Sou
muito medroso. Especialmente em relação a essas listas que indicam o que fazer
(ler, assistir, comer, visitar) antes de morrer. Eu, assim como a maioria das
pessoas viventes, não desejo morrer. Prefiro pensar na morte como um
acontecimento longínquo que pode ser mantido à distância enquanto eu fizer
coisas como respeitar os limites de velocidade nas rodovias, me alimentar de
forma mais saudável, não colocar os dedos molhados nas tomadas e coisas assim. Para
que, então, brincar com fogo?
Para
que comprar uma obra que me indica cem livros para ler antes de morrer? Dei uma
folheada na centena de indicações ali inseridas e detectei que já li umas 75
delas. E todos os outros 25 títulos restantes me interessam. Dez deles, por
sinal, já estão na pilha lá em casa, para serem lidos. Em o fazendo, estarei me
colocando perigosamente no final da fila para o encontro com a Maldita, segundo
as projeções do autor do livro.
Como
não sou besta, está decidido: só vou ler mais 24.
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