quarta-feira, 10 de abril de 2013

Profecia com todas as letras


Vou fazer uma profecia. E, como todo bom Nostradamus que se preze, tomarei o cuidado de datar o cumprimento de minhas previsões em um futuro longínquo o suficiente para garantir que eu não esteja mais por aí quando do advento das datas. Em a previsão se cumprindo, terei a infelicidade de não poder colher em vida os louros pelo acerto, mas confio na honestidade da História, que saberá me incensar com a devida justiça devido ao feito. Em não se cumprindo, me esquivarei espertamente do constrangimento de ter de inventar explicações que limpem minha barra, e que se ralem meus futuros detratores.
Então, vamos lá, ei-la: a internet não será responsável pelo desaparecimento dos livros, das revistas e dos jornais impressos. Ao menos, não nos próximos 100 anos.
Pronto. O que estou afirmando é que nossos netos e bisnetos, em 2113, ainda estarão em contato, no seu cotidiano pessoal e profissional, com esses centenários objetos de leitura que tanto amamos, impressos em papel, dobráveis, inflamáveis, rasgáveis, riscáveis, molháveis, sujáveis, facilmente carregáveis (e esquecíveis), singelamente acessáveis por meio de marcadores de páginas (normalmente, também impressos em papel), sublinháveis com caneta esferográfica ou ponta-porosa, alheios à necessidade de baterias recarregáveis ou à existência de eletricidade (exceto à noite, para que haja iluminação no quarto onde nos colocamos a lê-los), maleáveis, cheirosos, belos, charmosos, elegantes, concretos e tácteis.
Não, senhores, a internet não vai matar os livros e as publicações impressas em geral. Podem dormir tranquilos. Existem hábitos que a civilização arraigou ao comportamento e à cultura humanas e, entre esses, o ato da leitura na plataforma impressa é um dos que dificilmente serão abandonados pelos representantes futuros de nossa espécie. Ao menos, os do futuro próximo (falo em 2113, lembrem). As notícias de nossas mortes ainda sairão publicadas em páginas impressas nos jornais, bem como as alegrias dos anúncios sociais dos casamentos de nossos bisnetos, creiam-me. Quem viver, verá. Ou melhor, lerá.
A favor de minha tese profética, trago uma notícia publicada em fevereiro deste ano na imprensa (impressa) mundial. Em 2012, a receita obtida com assinaturas e com a venda de exemplares impressos da empresa The New York Times Company cresceu 10,4% em relação a 2011. Ou seja, o grupo norte-americano que edita os jornais The New York Times, The Boston Globe e The International Herald Tribune está vendendo mais jornais impressos e assinaturas do que antes. Mas não era para ser o contrário? Os jornais impressos não deveriam estar tendo seu mercado retraído com o avanço e consolidação dos blogs noticiosos mantidos por essas mesmas companhias?
E os livros? Publica-se como nunca antes na história da humanidade. As feiras de livro, as bienais e os encontros literários reúnem públicos cada vez maiores de leitores em todos os cantos do mundo, e vendem-se mais e mais livros (impressos) nesses lugares. O que a internet vem fazendo é exatamente agilizar, democratizar e ampliar o processo de aquisição de livros (impressos), e não retraindo o setor.
Meu tablet vai estragar se eu o deixar rolar ao chão ao pegar no sono em meio à leitura, deitado no sofá da sala. Meu livro, meu jornal e minha revista, no máximo, sofrerão um amassadinho e estarão me esperando alegremente para prosseguir na leitura quando eu acordar, amanhã de manhã.
Não, senhores. As traças, os ratos e os humanos de biblioteca prosseguirão sendo supridos com seu vital alimento impresso durante muito tempo ainda. Amansai vossas almas e boas leituras.

 (Publicado na seção "Planeta Livro" da revista Acontece Sul, edição de maio de 2013)

Um comentário:

Rafaela disse...

Concordo plenamente com sua profecia. :)

Mas confesso que ando meio deslumbrada com os livros digitais.

(Em tom alarmista agora:)Ah, sabe que aqui no Rio parece que vai desaparecer logo o tal do livro em papel. Quem sabe o senhor e sua senhora vêm conferir? ;)

Bjs