Que eu saiba, Patópolis nunca
teve uma via chamada Rua dos Viajantes, como aquela que sediava meus sonhos de
infância na altura do número 119, em Ijuí. Pavimentada com paralelepípedos
irregulares, a curta rua abrigava o processo de modelagem desse ser apaixonado
pelo universo dos livros e das leituras em que muito cedo me transformei.
Patópolis, a cidade imaginária onde vive boa parte dos personagens das
histórias em quadrinhos de Walt Disney, fazia parte desse processo, e minha rua
inteira parecia ser absorvida por aquele ambiente mágico de patos e ratos falantes
sempre que as páginas dos gibis eram abertas, convidando-me ao mergulho na
leitura.
Assim como muitos da minha
geração, alfabetizados na década de 1970 do século passado, tive nas
revistinhas do Pato Donald, Mickey, Zé Carioca e companhia, um suporte crucial
no processo de consolidação do hábito de ler. Minnie, Pluto, Pateta, Margarida,
Lampadinha, João Bafo-de-Onça, Maga Patalógica, Ronrom, Huguinho, Zezinho,
Luizinho, Peninha, são apenas alguns dos personagens que desfilam na avenida de
minhas lembranças hoje, da mesma forma como pareciam desfilar e fazer suas
estripulias pela Rua dos Viajantes de meus dias de criança.
Mas as fronteiras da imaginação não
se vergam a limites de nenhuma natureza. Nem nos meus mais absurdos sonhos
infantis eu conseguiria imaginar que, anos depois, já adulto e vivendo da
escrita profissional (como jornalista, escritor e cronista de segunda) em
Caxias do Sul, eu passaria a habitar a cidade-sede da editora que publica, no
Brasil, a linha de gibis Disney que tanto me foram (e ainda são) significativos.
Esse sonho doce se concretiza agora, quando chegam às bancas as edições de
estreia de cinco títulos Disney pela caxiense Editora Culturama, que assume a
missão deixada pela Editora Abril, a casa Disney no Brasil de 1950 até 2018.
Quac! Então, agora, Patópolis é
aqui, mesmo, com sabor de polenta e frango ao primo canto! O Mancha Negra que se
cuide com o Orco e o Sanguanel! O Tio Patinhas, imagino, ficará à vontade, ao
descobrir que já temos uma Caixa-Forte (“A Patada” fará concorrência ao
“Pioneiro”?)! A torta de maçã da Vovó Donalda passará a integrar o menu local de
sobremesas, ao lado do sagu gelado que tanto aprecio? A Praça Dante à noite
será vigiada pelo Morcego Vermelho em seu pula-pula? O Pato Donald terá
paciência para circular com seu conversível placas 313 pelo trânsito
engarrafado da Sinimbu nos horários de pico? Seja como for, benvenuti a tutti, Mickey, Pato Donald e
toda a galera! Que nos tragam bons sonhos.
(Crônica publicada no jornal "Pioneiro", de Caxias do Sul, em 25 de março de 2019)