sexta-feira, 23 de julho de 2010

O Brasil aos 44 do segundo tempo

Agora, então, terminada a Copa do Mundo da África do Sul, baixou uma sensação de ansiedade geral em relação à necessidade de prepararmos o Brasil para a próxima edição do torneio, previsto para acontecer em plagas verde-amarelas em 2014. O Coelho Branco de Alice saiu da toca e anda correndo para lá e para cá, metendo-se pelo meio dos pés de todos, relógio-despertador na mão (na pata, né), vaticinando “É tarde, é tarde, é tarde, é muito tarde”... Pois é, na minha opinião de velho ranzinza e rabugento, é tarde mesmo, mas fazer o quê...
Está na pauta do dia dos jornais, dos debates e dos programas dos candidatos às eleições as questões referentes à infraestrutura necessária para que sejamos capazes de sediar, sem vergonhas (ah, o bom uso das vírgulas e dos hífens, perceberam, seus sem-vergonha?), o portentoso evento que promete trazer hordas de turistas, muitos dólares, holofotes internacionais e astros da bola. E o que vemos são jornalistas e candidatos e atuais administradores e empresários e palpiteiros de todas as castas rezando em coro que precisamos correr não só para preparar (leia-se reconstruir) os estádios para que atendam às exigências da Fifa, mas também cumprir as demais demandas da Federação Internacional de Futebol.
Que demandas são essas? Ora, a Fifa quer que o país-sede da Copa do Mundo (de QUALQUER Copa do Mundo) disponha de uma rede de transportes em perfeitas condições (tradução simultânea: estradas em ótimo estado de conservação, transporte urbano positivo e operante, sinalização abundante e compreensível etc); aeroportos operacionais; sistema de segurança ativo e competente; opções de lazer e turismo; gente afável, hospitaleira e capaz e se comunicar em inglês (quatro anos para aprender a diferenciar “thank you” de.... bem..... deixapralá) e por aí afora.
Em resumo bem resumido, ficamos assim: temos quatro anos para construir um país apresentável para os padrões da Fifa. Oito semestres para fazermos tudo aquilo que não conseguimos fazer desde que nossos índios avistaram caravelas poluindo as nossas até então imaculadas praias, quinhentos e tantos anos atrás. Duzentas e poucas semanas para maquiarmos o país. Sim, porque, pelo jeito, os padrões da Fifa são bem diferentes dos nossos níveis nacionais de exigência, afinal, quem é que precisa de segurança, saúde, educação, lazer, estradas, metrô, ônibus no horário para ser brasileiro? A gente vem dando um jeitinho e vai levando desde sempre, oras bolas.
E vem cá, as cláusulas de exigências da Fifa incluem também a necessidade de um povo cumpridor de leis, observador de regras civilizadas de convivência, pagador de tributos, respeitador de regras de trânsito, observador de lei do silêncio e por aí afora? Ou podemos continuar sendo os bárbaros mal-educados e incivilizados que somos desde sempre, jogadores de casca de banana na calçada, que não tem problema, desde que os estádios estejam bonitinhos e confortáveis? Ah, bom, então tudo bem, ufa! Achei que eu também teria de mudar!!!!!!!!!!!
(Crônica publicada no jornal Informante, de Farroupilha, em 23/07/2010)

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