sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Incômodas entrelinhas

Já comentei aqui algumas vezes a existência daquele grupo de velhinhas que se reúnem às sextas-feiras à tarde para tomar chá, mordiscar biscoitos de água e sal e ler as minhas colunas, nas quais não conseguem encontrar gosto algum, classificando-as como normalmente mais insossas do que as bolachinhas, quando não, odiosas (minhas crônicas, não as bolachinhas). Elas sentem-se desrespeitadas pela minha recorrente construção de parágrafos intermináveis, como o do período anterior, a lhes exigir um fôlego de leitura incompatível com a longevidade que as caracteriza.
Tenho tentado (bem pouco, confesso) corrigir essa minha falha de estilo, decorrência direta de meu caráter tergiversante, policiando o andamento dessas frases quilométricas que mais parecem estar se preparando para uma maratona do que desenvolvendo uma ideia literária, mas nem sempre consigo cercear o empilhamento de intercalações virguladas a tempo de encerrar mais cedo as sentenças, desperdiçando antiecologicamente as vírgulas e perpetuando uma economia injustificável de pontos finais, como isso agora, que viciadamente acabo de estender até o limite do gás vital. É como se as frases tomassem fermento após a letra maiúscula e fossem crescendo desmesuradamente até abatumarem a palavrança toda lá no longínquo ponto final. Que horror, isso!
Mas as minhas desafetas de carteirinha informam, na última missiva, que descobriram outro motivo para odiarem os textos de minha autoria. Trata-se do excesso de entrelinhas, de camadas de leitura, que camuflam duplos sentidos em temas e situações aparentemente banais, mas que, para o leitor mais atento, sugerem reflexões acuradas sobre o cotidiano e escapam ao alcance do grau dos óculos que elas andam usando para ler-me. Resumindo: elas me querem mais curto e mais grosso. Odeiam serem obrigadas a abrir a despensa de suas almas em busca da geleia com a qual poderiam avivar o conteúdo de textos aparentemente indeglutíveis. Elas já fazem isso com as bolachinhas de água e sal, e lhes é o bastante. De resto, que tudo lhes chegue já mastigado, a começar pelos meus escritos.
Mas por que elas simplesmente não trocam de marca de bolacha?
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 9 de dezembro de 2011)

4 comentários:

Anônimo disse...

...de repente a Assessoria de Imprensa da outra bolacharia não funciona, ou então o SAC(o) não responde hehehehe

J.Cataclism

Juliana disse...

Fico pensando se és assim tão verborrágico quando conversas... hehehe!! Abraço!

marcos fernando kirst disse...

rsrsrsrs... se eu for assim ao vivo, haja fôlego para me escutar... hahahaha!

Anônimo disse...

...semana passada, ao terminar a releitura do "Dois Passos", lembrei deste tópico quando passei pelo trecho onde Otto relembra a morte de Orestas, na escura noite da estância. Ufa! heheheheheh

J.Cataclism