domingo, 25 de março de 2012

Contra o lugar-comum

Está bem, eu sei que vou escrever um lugar-comum, mas também sou filho de Deus e tenho o direito de exercer minha pobreza de espírito igual a qualquer outro. Lá vai ela: nada melhor do que o tempo para conferir o devido valor às coisas, especialmente no que tange ao reino das artes. Pronto, feito! Não há como o leitor discordar da essência da frase de efeito, daí o seu valor inalienável. Isto posto, vamos ao que interessa.

Evoco essa coisa da sapiência que reside na passagem do tempo para defender a necessidade de se olhar com menos preconceito e menos ansiedade as manifestações artísticas que surgem ao nosso redor. Há muita criatividade e genialidade escondidas por trás (na verdade, raramente escondidas e sim, via de regra, escancaradas, porém invisíveis para a miopia dos críticos) das criações artísticas que nos rodeiam, porém, o mar raso pelo qual navegam as gentes impedem que soltem-se as amarras que insistem em prender obras e artistas na areia movediça do anonimato e da falta de reconhecimento.

Que o diga o cinema, por exemplo. Hoje consolidado como a sétima arte, não há quem duvide do valor dos filmes enquanto expressões artísticas, sem fazer aqui juízo de valor sobre a qualidade de uma ou outra obra. O cinema, em si, é arte, e disso hoje em dia ninguém duvida. Mas não foi sempre assim. Erico Verissimo, na primeira viagem que fez aos Estados Unidos, em 1941, teve a oportunidade de conversar com vários atores, atrizes e cineastas (entre eles, Orson Welles), que lhe garantiam o fato de o cinema estar finalmente começando a ser visto naquele país como uma forma de arte válida, e não apenas uma brincadeira juvenil passageira. Demorou, mas o cinema desfruta hoje de seu merecido lugar entre as formas sublimes de expressão artística desenvolvidas pelo gênio criativo da humanidade.

As artes gráficas de narrativas sequenciais, ainda conhecidas como histórias em quadrinhos, abrigam há décadas gênios criativos nas áreas da ilustração e do roteiro que amargam o preconceito e o desconhecimento do grande público. Mas o tempo lhes haverá de redimir, vencendo, mais uma vez, o senso comum.

(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 23 de março de 2012)

2 comentários:

J.Cataclism disse...

Para esses casos, eu ouso discordar da questão "tempo"; Acho que é mais modinha ou oportunidade. Não em relação ao talento ou aos 'gibis'/quadrinhos em questão; Ao contrário, pois destes, eu sei que só vem coisa boa.

Refiro-me ao reconhecimento; Acontece não com o passar do tempo, mas quando algum alguém, naquele lugar, com aquela atenção do público para ele voltado, trata a respeito de tal assunto.

Ó o que aconteceu em 2011, com o filme 'Cães de Aluguel': foi aparecer a sinopse numa revista ou algo do tipo, e, em menos de uma semana, comecei a escutar vários conhecidos perguntando a respeito, empolgados em assistir. Sendo que o filme bombou faz anos.

Mas que os "nossos" ilustradores estão demorando a ser reconhecidos, isso estão. Não apenas pela técnica, mas principalmente pela inteligência sacada em cada assunto abordado.

Vejamos daqui a algum tempo...

marcos fernando kirst disse...

É, tens razao. Mas nao faltam materias de pagina inteira enaltecendo a qualidade literaria e artistica de HQs que viraram classicos e, mesmo assim, boa parte do publico, mesmo o dito culto, segue torcenco o nariz para essa genial forma de expressao artistica, rivando-se e privando outros de se conectarem com essas obras de arte. Nao é faciu...