segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

Sonhos que caem por terra

Estamos completando uma longa semana de uma inominável dor iniciada no cruzar da noite de segunda para a terça passadas, quando uma tragédia aérea que ganha contornos de crime ceifou as vidas de 71 pessoas nos arredores de Medellín, na Colômbia. O Brasil e o mundo compartilham um luto temperado com incredulidade, estupor, tristeza profunda e, em alguns momentos, até mesmo revolta, quando se começa a perceber que o acidente poderia ter sido evitado caso elementos como a ganância, a irresponsabilidade, a imprudência temerária não tivessem entrado em cena. A dor entrou em campo e lotou os espaços nas cerimônias fúnebres realizadas nos estádios do Atlético Nacional de Medellín e da Chapecoense, em Chapecó. Em Medellín, o povo colombiano emocionou o mundo com sua sensibilidade e capacidade de empatia humana, pegando simbolicamente no colo todo um Brasil enlutado.
Mas, ao lado dos jogadores da Chapecoense, dos integrantes da comissão técnica, dos jornalistas e dos membros da tripulação presentes ao fatídico voo, houve outra vítima importante e significativa a bordo da aeronave que se espatifou na montanha. Encontrou ali também um fim inesperado uma gama de sonhos que até então vinham sendo construídos pelas vidas de cada um dos que as perderam dessa maneira absurda. Morreram os sonhos de cada atleta, de cada jornalista, de cada profissional que perdeu a vida no acidente. Morreram os sonhos de seus familiares e amigos; morreram os sonhos das torcidas; dos cidadãos chapecoenses; dos catarinenses e dos brasileiros. Morreram também os sonhos dos amantes do futebol, essa imensurável família universal cujas mais belas características foram personificadas pelos colombianos e brasileiros, que souberam reverenciar a civilização humana protagonizando tão pungentes despedidas.

Sabe-se que as grandes tragédias servem de palco para o aflorar do melhor de cada ser humano. É verdade. Mas também não se pode esquecer (e talvez resida aí uma das importantes lições a se tirar disso tudo) que existem os destruidores de sonhos, e é fundamental saber reconhecê-los para podermos nos precaver contra eles. Os destruidores de sonhos estão à espreita e habitam as esquinas da vida humana, sempre prontos a levar vantagem sem se preocupar com as consequências de seus atos. Eles estão à solta na sociedade esgrimindo suas imprudências e ilegalidades. Estão em todas as esferas da vida, disfarçados, muitas vezes, de gente profissional, ética e decente. Não se pode voar por aparelhos nas proximidades de destruidores de sonhos.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 5 de dezembro de 2016) 

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