segunda-feira, 14 de março de 2011

Um pequeno cidadão

O rapaz do caixa bate os dedos nas teclas da máquina de somar para descobrir o montante que devo desembolsar para quitar a conta de meu almoço no restaurante que serve comida vendida a peso. Subitamente o processo no qual estamos envolvidos é interrompido por um cidadão de cerca de um metro de altura, que aproximara-se sem que nenhum de nós houvesse dado por conta de sua presença. Do alto de seus não mais do que três aninhos de idade, enfiado em uma calça estilo capri e sandálias, ele ergue o braço direito em direção ao caixa e expressa sua solicitação:
- Moço, me dá uma bala?
Terminada a refeição na qual tenho certeza de que limpara todo o prato, o rapazinho fora liberado pelos pais a atravessar o salão e solicitar a guloseima distribuída gratuitamente às crianças pelos donos do estabelecimento, a título de sobremesa.
- Você quer a vermelha ou a verde? – indaga o caixa.
- Vermelha – responde, convicto, com a vozinha que mal alcança os ouvidos do interlocutor.
A balinha redonda envolta em papel transparente esvoaça entre os dedos do caixa saindo de dentro do baleiro e indo pousar na concha formada pela união das duas mãozinhas que recebem o trunfo tão aguardado naquele final de meio-dia. Antes de retomarmos o processo de cobrança e pagamento em que estávamos envolvidos, escutamos a derradeira frase do cidadãozinho, dirigida ao rapaz do caixa:
- Obrigado.
Com todas as letras e pronunciada sílaba por sílaba em bom som: “o-bri-ga-do”, disse ele; girou nos calcanhares e retornou ao local de onde viera para pescar sua bala vermelha. Gostei de ver o pequeno cidadão em ação. Ciente de seus objetivos, enfrentou sozinho a distância que o separava do aconchego da mesa dos pais até o alvo que continha sua meta desejada. Auxiliado por quem de direito, no caso, o rapaz do caixa, a quem acionara por meio de um pedido claro e consciente, não furtou-se de concluir o processo expressando o sinal da boa educação a que é submetido em casa, agradecendo o gesto com um sonoro “obrigado”, dito do coração, e não apenas para os pais verem (nem viram, estavam sentados longe).
Isso tudo com três anos de idade. Já é, pois, um cidadão. E com tanto a ensinar a tantos outros com tanta mais idade do que ele...
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 11 de março de 2011)

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