Por
livre e espontânea iniciativa, eu jamais escolheria o filme “A Sogra” para
dedicar quase duas horas de minha vida defronte à tela da tevê. Nada contra o
tema indicado no título, uma vez que sou fã de minha sogra e tenho por ela o
maior apreço. A questão é que o tempo é curto e, quando pinta a ocasião,
costumo priorizar determinados filmes da lista que há muito desejo assistir e
esse em questão não estava incluso. Mas a vida é feita de surpresas e “A
Sogra”, comédia leve norte-americana de 2005, tendo no elenco estrelas como
Jennifer Lopez e Jane Fonda, revestiu-se em uma delas. Explico.
O
inesperado encontro com o filme deu-se manhã dessas em que transportei para a
sala a bicicleta ergométrica a fim de empilhar pedaladas que viessem a culminar
no queimar das gordurinhas que andam se mancomunando ao redor de minha cintura
com a sorrateira intenção de dar um golpe que derrube minha saúde e encurte o
mandato de minha expectativa de vida. Ligo a televisão com a intenção de animar
o exercício feito a quatro paredes e daí zapeio, já pedalando, para encontrar
algum programa que anestesie a compreensão de que estou mesmo combatendo o
sedentarismo que me define. Estacionei no filme que se iniciava, primeiro, por
cansar de equilibrar perigosamente o controle-remoto em uma das mãos que
deveria estar no guidão e, segundo, porque Jennifer Lopez está muito bela nesse
(só nesse?) e achei que apreciar beleza enquanto pedalava seria um combustível
a mais.
Lá
pelas tantas, Charlotte, a personagem de Jennifer Lopez, sai-se com esta
pérola: “a vida é curta demais para viver o mesmo dia duas vezes”. A personagem
procurava explicar ao futuro namorado a razão pela qual ela se dedicava a uma
gama infinita de atividades a cada dia, ampliando seu espectro de interesses e
fazendo de cada dia de sua vida uma experiência única. A partir daquele momento,
abstraí da trama e me pus a refletir sobre o conceito com que o filme acabara
de me brindar. De fato, a vida é curta e costumamos nos curvar à tendência de
deixar a insossa rotina nos envolver e nos roubar a capacidade criativa de
conferirmos sabores especiais aos nossos dias.
“Um
dia por vez”, já cantava John Lennon, em antítese ao cenário descrito por Chico
Buarque com seu “todo dia ela faz tudo sempre igual...”. Claro que falar é
fácil. Vivemos a vida real, não somos personagens de uma comédia romântica. Mas
também não custa nada procurarmos, às vezes, driblar rotina, dar uma pedalada
na mesmice e agregarmos aos nossos dias alguns temperinhos especiais. Charlotte
tem lá sua razão.
(Crônicas publicada no jornal "Pioneiro" em 10 de outubro de 2016)
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