segunda-feira, 18 de junho de 2018

Salve a data e a língua!


Recebo via e-mail um convite para um evento. Os organizadores, organizados que são, enviam com antecedência de cinco meses o convite, a fim de que seus convidados possam se organizar a tempo (a pobreza de vocabulário invadindo tal qual vírus o estilo do cronista, enfileirando flexões empobrecidas dos termos  “organizadores”, “organizar”, “organizados”, “convite”, “convidados”... mas está frio demais para vasculhar regiões glaciais do cérebro em busca de sinônimos que enriqueceriam o texto... vai assim mesmo e peço calor humano...). Compreendo o objetivo louvável dos elaboradores (“elaboradores”? Não, horrível... voltemos a “organizadores”), que, a partir dessa técnica de antecipação convidacional (agora apelei ao neologismo; pelo menos, surpreende), convidam o convidado (argh!) a se organizar (ai!) e a já reservar a data em sua sempre atribulada agenda de compromissos.
Até aí, tudo bem. Problema é essa mania crescente, inexplicável, indesculpável e desconfortável que as pessoas andam cultivando, aqui pelas plagas verdeamarelas, de usar e abusar de termos, palavras e expressões em inglês para dizer aquilo que a língua portuguesa é capaz de expressar com perfeição e até mesmo, na maioria das vezes, com mais elegância. Lá vem o convite, aterrissando na tela de meu computador, via correio eletrônico (por que “e-mail”?), pedindo para que eu, em novembro, “save the date”. Hã? Cadê meu livrinho do nível três do cursinho de inglês? “Save the date”, explode na tela, alegre e brilhante, convidando-me a reservar a data. Não seria mais eficiente os organizados organizadores, ao convidarem o convidado, irem direto ao ponto solicitando, em bom português, que ele “reserve a data”? Por que tenho eu de “save the date”? What a hell? Quer dizer... Que diabos! Ou, em dialeto “talian”... Será que escrevem assim imaginando serem “chiques”? Ora, ser chique é cultivar a sua própria língua, a sua cultura, e não inflar estrangeirismos desnecessários.
Mas, de volta ao tema. Por que “save the date”? Por que os preços em promoção agora ficam “off” nas vitrines? Por que a invasão de “outlets”? Estabeleceu-se, porventura, o mantra de que em inglês o cliente gasta mais? Em inglês o convidado reserva a data? Por que não empregar então, em Caxias do Sul e adjacências, o italiano? “Prenota la data”, deveria sugerir o convite. Para convidar os vizinhos da Região das Hortênsias, vamos direto no alemão: “Buchen Sie das Datum”, e pronto, estaremos todos lá, reunidos, felizes e contentes, na data devidamente “saved”. Afinal, tudo é uma questão de organização, isn´t?
(Crônica publicada no jornal "Pioneiro", de Caxias do Sul, em 18 de junho de 2018)

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