segunda-feira, 11 de março de 2019

Entre ferros, com postura


“Postura, Marcos, postura! Observa a postura!”, costumam exclamar meus instrutores de treino na academia, onde passei a ser uma presença inesperadamente regular. “Tchau, até o próximo treininho”, abanam eles, sorridentes, sempre que concluo mais uma sessão de exercícios elaborados com a intenção de me resgatar das profundezas maléficas da movediça e afundante areia do sedentarismo. “Treininho” para eles, claro, habituados que estão a puxar aqueles ferros com a ponta do dedo mindinho e a carregar os halteres de lado a lado com a mesma desenvoltura e naturalidade com que eu troco de lugar os livros de minha biblioteca. Atento e disciplinado, vou suando e aprendendo.
Aprendo, por exemplo, que de nada adianta fazer três sequências de dez erguidas de peso se eu não fixar corretamente os pés no chão, com as pernas bem separadas e o corpo ereto como quando procuro melhor visualizar, por sobre as cabeças da multidão, o carro das rainhas no Corso Alegórico na Rua Sinimbú. Para obter o resultado ideal do treino, é preciso não só seguir a sequência e puxar os ferros, mas fazê-lo com a postura correta. “Postura, Marcos, postura!”. Tudo é uma questão de postura, e estão certos a Renata e o Eduardo, meus atentos e dedicados treinadores, em constantemente me puxar as orelhas enquanto puxo eu os ferros. Má postura gera más consequências e, além disso, revela, em sua origem, uma relação precária com as coisas, de desleixo, de desatenção ou de desconhecimento. É preciso estarmos sempre atentos à postura, porque ela também dá indícios sobre quem somos, o que e como somos.
Até as galinhas no aviário dedicam-se à postura, diria algum cronista mundano de segunda disposto a fazer gracinha. Nós, aqui, que somos sérios, pensamos além e evocamos a importância da postura também nas relações pessoais, no trabalho, na sociedade, em público, em casa, em família, nas redes sociais virtuais e reais. Nossa postura, tanto a física quanto a comportamental, expressa as nuances de nossa essência, nos define e diferencia. Qual a sua postura, por exemplo, frente à morte súbita de uma criança de sete anos de idade, descendente direta de um político controverso? Há aqueles que, movidos pela empatia humana que aflora frente às tragédias, se condoem e se solidarizam. E há os que desdenham e politizam a desgraça, aprofundando a desumanização de uma sociedade doente. A postura fala e revela, desmascara e escancara. “Postura, Marcos, postura!”, repetem a Renata e o Eduardo. Estão certos. É preciso atentar à postura, tanto na academia de musculação quanto na academia da vida.
(Crônica publicada no jornal "Pioneiro", de Caxias do Sul, em 11 de março de 2019)

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