Viajando um domingo à tarde pelo romântico e bucólico interior de nossa
região rumo a Criúva, a fim de visitar o túmulo da poetisa Vivita Cartier,
patrona da cadeira 11 da Academia Caxiense de Letras, chamou-me a atenção um
detalhe nesse quadro de belezas naturais ao qual somos privilegiadamente
submetidos na Serra gaúcha. Tanto à beira das estradas vicinais quanto nos
pátios das residências, mesmo nos perímetros urbanos, as árvores frutíferas
exibem exuberantes a generosidade de seus carregamentos de frutas, praticamente
intocadas. Em diferentes épocas do ano, estão lá os cáquis, as laranjas, as
bergamotas, as uvas, as ameixinhas e tantas outras, adornando os galhos de suas
árvores-mães como se fossem enfeites de um eterno e renovável Natal natural,
oferecendo as doçuras de seus sabores... aos pássaros e aos bois!
Que festa devem fazer nesses dias de hoje os pardais e tico-ticos, tendo
à disposição a fartura dos cardápios frutais sem que tenham de negociar as
melhores laranjas de amostra com nenhuma criança escaladora de árvores, sedenta
por arrancar as maçãs e os pêssegos do pomar da vizinha e levar para casa o
suculento butim. Décadas atrás, quero-queros e caturritas precisavam disputar
gomo a gomo com gurizada de joelhos esfolados e bodoque no bolso dos fundilhos dos
calções as riquezas coloridas ofertadas nos galhos das árvores frutíferas. Mas,
agora, está lá tudo para eles, os pássaros, uma vez que a meninada de hoje tem
interesses e gostos diversos.
As crianças de ontem, que são os adultos atuais, não possuem o tempo
necessário para se enfiar sob a sombra das árvores e arrancar os frutos para
saboreá-los junto ao pé. Já as crianças de hoje, que teoricamente disporiam
desse tempo por não precisarem se envolver na luta diária pela sobrevivência de
suas famílias, gastam as horas livres de suas infâncias se enfurnando dentro
dos quartos de suas casas, conectadas à internet, por meio da qual criam
fazendinhas virtuais onde plantam e cultivam pomares repletos de frutas
coloridas, insossas, inodoras e intangíveis. Devoram é sacos e sacos de salgadinhos,
fáceis de abrir, desnecessários descascar. Já a passarada lá fora se lambuza e pia
“amém”.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 8 de junho de 2012)
2 comentários:
Muito legal a tua maneira de perceber esses detalhes, Kirst.
Ao menos uma parte da flora curtiu - e até agradece - esse aspecto evolucionário dos humanos hehehe.
Tem razao, Cataclism, quem agradece sao as árvores... hahaha. Grato pelo comentário. Abraçao.
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