A vida em sociedade neste início de século 21 é tão perigosa e selvagem
quanto a de meus ancestrais que, um milhão de anos atrás, precisavam fugir de
dinossauros e esquivar-se do pipocar de pedras fumegantes expelidas pelos
vulcões. Dia desses, saí a pé de um restaurante logo depois do almoço, em dia
de semana, e estanquei à beira da faixa de segurança, aguardando o melhor
momento de cruzá-la, já que faixas de segurança costumam ser um dos lugares
mais perigosos para se estar no trânsito brasileiro.
A oportunidade de passar surgiu quando o motorista de uma van escolar
parou e me fez sinal para atravessar (em Estocolmo, basta colocar o pé na faixa
para que a primazia seja do pedestre, mas eu sei que vivo em Caxias do Sul, Rio
Grande do Sul, Brasil, América Latina, e ainda não estamos preocupados em
importar cidadãos civilizados e muito menos em produzi-los por aqui mesmo). Dei
início à minha travessia, mas ela foi bruscamente interrompida na outra metade
da rua pelo cruzar ensandecido de um veículo dirigido por um psicopata
motorizado que por muito pouco não foi responsável por obrigar o editor do
Pioneiro a buscar outro cronista para me substituir neste espaço.
Só não fui atropelado cruzando a faixa de segurança (como ocorreu, por
sinal, de forma fatal, com meu pai em Ijuí, anos atrás) porque, encarapitado
sobre a agilidade corporal que meus 45 anos de idade ainda me proporcionam,
ginguei o corpo e me protegi do bólido assassino, não sem antes exclamar
“caaaaaalma, caaaaaalma!”. Ao que recebi em resposta, já metros adiante, do
condutor psicopata, um sinal obsceno ofertado por seu braço janela afora.
Resumo: o brucutu quase me atropela na faixa de segurança e ainda se
julga no direito de me ofender. Fantástico! Pior é que provavelmente se trata
de pessoa com família, emprego fixo, perfil no facebook, querido pelos amigos,
amado pela mamãe, indignado com a corrupção no país etc. Só que não passa de um
psicopata sobre rodas. É, tá feia a coisa. Chego a invejar aqueles meus
ancestrais que tinham de se esquivar somente de tiranossauros-rex. Esses, ao
menos, não se camuflavam de gente.
Um comentário:
...é que tu precisas entender que, certamente, esses psicop... digo, essas pessoas sejam provavelmente mais importantes na sociedade, o que ocasiona o resultado de que seus (delas) horários, atrasos e compromisso são, também, mais importantes.
Tu é que não esperou o momento certo...
:-/
É, tá feia a coisa, mesmo. Sem contar naquelas que já falou em teus textos, que é quase sempre na travessia sobre a faixa que se encontra alguém para um bate-papo haha!
Uma pena o que aconteceu com teu pai mas, mesmo assim, até como publiquei numa cartinha ao Pioneiro ali por fevereiro ou março, te sugiro uma passeadinha, a pé, em Nova Prata; senti a mesma sensação de quando caminhava por Nova Petrópolis ou Gramado: eu mal precisava ensaiar um pé querendo pisar sobre a faixa, seja ela no meio da rua ou nas esquinas, os motoristas já paravam - não importando se o veículo anterior apenas tivesse parado e andado para outro pedestre.
Só assim, mesmo, pra se animar que ainda possa haver jeito. Lá, claro, porque aqui, sinto muito: era mais fácil mesmo para os ancestrais, na sobrevivência do mais forte ou, dependendo do caso, do mais motorizado (quissá galopando algum mamute se tivesse mais chance também naquela época).
Até breve!
J.Cataclism
Postar um comentário