Muitos séculos atrás, num
passado realmente distante, a data de 9 de maio consistia em uma efeméride
importante no calendário do povo que dominava a maior parte do planeta no Mundo
Antigo: os romanos. Era nesse dia que celebrava-se um festival muito popular
conhecido como Lemúria, ou Lemurália. O principal objetivo dessa celebração
(que também acontecia nos dias 11 e 13 do mesmo mês) era dar um para-te-quieto
nos espíritos dos mortos que, acreditava-se, ficavam rondando as casas das
pessoas. Especialmente os espíritos de parentes e ancestrais já falecidos.
Em cada uma dessas datas, cabia
ao chefe da família cumprir todo um ritual estipulado para fazer com que os
espíritos penados parassem de rondar os lares e fossem descansar em paz,
deixando, por tabela, descansarem também em paz os ainda vivos habitantes das
moradas. Cabia ao “pater famílias” (pai de família) descalçar suas sandálias e,
descalço, dar voltas ao redor da casa, sempre à meia-noite, estalando os dedos,
para afastar os espíritos. Depois disso, ele lavava as mãos nas águas correntes
de uma nascente, pegava umas favas e atirava-as pelas costas, sem olhar para
trás. Enquanto as favas eram consumidas avidamente pelos espíritos, o “pater
famílias” devia afirmar nove vezes, em voz alta, que estava fazendo aquilo para
redimir a família.
Reza a lenda que esse festival
teria sido instituído por Rômulo, o mítico fundador de Roma, para apaziguar o
espírito de seu irmão gêmeo Remo, que teria sido assassinado por ele. Rômulo
sentia remorso pelo assassinato do irmão e, por isso, criara todo um rito para
acalmar os espíritos vingativos dos mortos (inicialmente batizado de Remúria).
Por sinal, “remorso” (inquietação da consciência por culpa ou crime cometido) e
“remoer” (pensar ou refletir muito, afligir-se) são palavras que trazem na
origem a raiz do nome do irmão de Rômulo, Remo. Coincidência linguística? Sei
lá. O fato é que, com a derrocada do Império Romano, já se perde nas sombras do
tempo a última vez em que celebraram-se os ritos da Lemúria em 9 de maio.
É uma pena que o remorso seja
uma sensação que ande tão em baixa nos dias de hoje e ninguém mais sinta a
necessidade de expiar os erros praticados contra os demais (vivos ou mortos) celebrando
rituais em que se procure expiar a culpa pelo mal cometido. A regra em alta na
atualidade é patrolar a tudo e a todos sem remorso algum e varrer as culpas
para debaixo dos tapetes. Os remorsos de Rômulo e sua Lemúria são coisa do
passado. E ainda tem quem ache que estamos evoluindo...
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