Do grande, do vitorioso, do
poderoso, do vencedor, temos o direito e o dever de exigir generosidade e
humildade. Do pequeno, do humilde, do fraco, do perdedor, não podemos exigir
nada, porque, conforme ensinava o sábio Barão de Itararé, “de onde menos se
espera, dali é que não sai nada, mesmo”. Não cabe ao grande ser altivo,
presunçoso e prepotente, porque, em sendo assim, incorrerá na soberba, e a
soberba é a ferrugem que carcome as bases da grandeza, levando-a à derrocada e
à ruína. Se fores grande, sê dócil, leve e acessível. Não envelopa tua grandeza
no celofane traiçoeiro da arrogância, porque ela é a argamassa da fundação do
castelo de areia em que te verás assentado. Muitos serão os que, movidos pela
inveja, soprarão essas frágeis fundações, e logo te verás quedado sobre as
ruínas das dunas fugazes que tu mesmo edificaste. Sê manso, mesmo que grande,
porque é essa mansidão que carimbará teu passaporte para a perenidade.
Se fores grande, saibas que a
legião dos pequenos que te rodeiam nutre expectativas imensas de ti. Exigem de
ti o que neles não veem possibilidade de obter, e projetam em ti aquilo que
gostariam de ser. Mesmo que não o sejas, mesmo que te vejas pequeno para
atender às exigências, faz o teu melhor, porque é isso que se espera de um
grande. Arca com essa responsabilidade, porque a grandeza não é uma esfera que
se atinge sem portar demandas. “Vae victis!” (“Ai dos vencidos”!), gritou o
gaulês Brennus, no século quatro antes de Cristo, ao vencer os romanos e
saquear uma Roma subjugada. “Gloria victis” (“Glória aos vencidos”!), foi a
locução criada em antítese à prepotência do vencedor gaulês, que poderia ter se
poupado de entrar para a História por pronunciar frase tão infame. É fácil,
aliás, um grande, um poderoso, assentar-se na eternidade devido à infâmia a que
se vê seduzido (e reduzido) por sua posição privilegiada.
Ao forte cabe cuidar dos mais
fracos, e não usar sua força para oprimi-los. “Junto a um grande poder, surge
uma grande responsabilidade”, já ensinava nos quadrinhos o tio do Homem-Aranha,
em diálogo eternizado pela genialidade de Stan Lee. Chefe bom não é o que impõe
temor, mas, sim, o que inspira exemplo. Difícil, isso. Não é para todos. A
altura seduz, sim, mas é prudente saber que a queda do alto costuma ser mais devastadora
do que a mera escorregadela ao nível do solo. “Vaidade das vaidades, tudo é
vaidade”, nos alerta há milênios o Eclesiastes. Vale pra todo mundo. De minha
parte, madama, sempre quis escrever uma crônica epistolar. Mesmo ciente de que
ela sempre será de segunda...
(Crônica de Marcos Fernando Kirst publicada no jornal "Pioneiro", de Caxias do Sul, em 8 de abril de 2019)
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