sexta-feira, 17 de setembro de 2010

O Adão dá bom-dia

Você já deu “bom-dia” hoje? Ou está guardando para alguém que valha a pena, ou para algum momento solene? Se sim, você tem lá sua razão, pois um “bom-dia” vale ouro. Adão também pensa assim, mas é por isso mesmo que não os economiza.
Ele os distribui à larga, a todos os que chegam, a todos os que saem. É um esbanjador de bons augúrios. É um perdulário de civilidade. Gasta seu cumprimento sem parcimônia, como se o estoque lhe fosse inesgotável e em constante processo de reposição. E o é, de fato. Para a felicidade dele e de todos os que frequentam seu estabelecimento.
Adão tem um sorriso estampado nos lábios, uma genuína paixão por encontrar gente. Doa a todos as energias positivas que seu espírito parece gerar. Adão dá “bom-dia” em alto e bom som, transformando o cumprimento na principal música-ambiente do restaurante que pilota. Um “bom-dia” recebido assim na entrada se transfigura em brinde ofertado a cada cliente que vai ali comer a quilo, a maioria com tempo curto e fome larga.
Eles vêm e retornam porque a comida é boa, porque o atendimento da equipe é acolhedor, porque o ambiente é agradável. Muito disso, senão tudo, decorre diretamente do “bom-dia” do Adão. Para ele, não custa nada. Para quem recebe, vale muito. Mesmo que alguns ouvidos não escutem com a devida atenção, não há como a mais cimentada alma não ser tocada pela sonoridade do dito e pela verdade do desejo de que se tenha, pelo menos a partir dali, um dia que valha a pena ser vivido.
Descobri, após conversas ao pé do ouvido, que o fornecedor de “bons-dias” desobrigou Adão de qualquer espécie de pagamento pelo produto, desde que ele faça uso amplo da mercadoria. E ele cumpre à risca o contrato, diária e constantemente:
- Bom dia!
- Booooom diaaaaa!
- Bom diiiia!
E sempre junto um sorriso largo e sincero, e uma olhada nos olhos do interlocutor, para consolidar e personalizar a entrega.
Precisamos universalizar esse fornecedor de “bons-dias” que atende ao Adão, e com certa urgência, porque, do jeito como a coisa vai aí pelo mundo, tenho a impressão de que já tem gente querendo cobrar pela gentileza. Com o Adão, o produto ainda é de graça, abundante e sincero.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 17/09/10)

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