segunda-feira, 22 de agosto de 2011

O mal do século

Não é a Aids, não é o câncer, não é o Alzheimer, não é o estresse e tampouco a depressão. A doença que simboliza o mal do século não é outra senão a velha e medieval preguiça, apresentada em sua forma mais devastadora, que é a preguiça mental. É a falta de vontade de colocar o cérebro em funcionamento o grande problema crônico que devasta milhões de seres humanos espalhados pelos quatro cantos do mundo, transformando-os, por autoindução, em robôs idiotizados cujos pescoços circulam pelas ruas servindo meramente de suporte para uma caixa craniana pesada em ossos e esvaziada pelo vácuo que represa em seu interior. Muito triste de ver, senhores.
A tal preguiça mental (doença classificada como autoimune, uma vez que é produzida pelo próprio organismo do portador) é responsável por desencadear uma série de outros sintomas correlacionados, sendo os mais comuns o desinteresse e a apatia em relação ao mundo que cerca os portadores da enfermidade. Essa manada de neoacéfalos prefere aceitar todo o tipo de informação que lhes chega sem contrapor o menor questionamento, engolindo qualquer coisa que lhes for arremessada, a exemplo dos bebês-pássaros que permanecem de bicos escancarados nos ninhos à espera do jantar que a mamãe-pássaro se incumbe de procurar. De bocarras abertas, aguardam passivamente o que o céu lhes atirar goela abaixo, e dependem da boa-vontade de terceiros para que a qualidade do cardápio seja decente. Na maioria das vezes, engolem é minhocas mesmo. Se preferirem dourados e saborosos grãos de milho, vão ter de aprender a voar e a caçar por conta própria (mas aí é necessário superar a preguiça, exatamente no ponto em que a porca começa a torcer o rabinho).
Dia desses li num jornal uma professora da PUC de São Paulo afirmando que a internet utiliza uma “retórica da infantilização” na criação de nomes de empresas virtuais que se transformam em ferramentas de uso diário, como o Google e o Yahoo, entre outros. A tese até pode estar correta, mas os exemplos foram infelizes, e faltou à pesquisadora pesquisar um pouco mais a respeito da origem dos termos que utilizou como exemplo. O Google faz referência ao número imaginário (batizado como “googol”) inventado por um matemático norte-americano (Edward Kasner), representado pelo número dez elevado à potência 100, que simboliza uma quantidade astronômica maior do que qualquer coisa mensurável no universo. É um número inatingível, maior até do que as partículas subatômicas existentes na Criação. Alguém sabia disso?
Já “Yahoo” é um termo criado pelo escritor irlandês Jonathan Swift (1667-1745), no livro “As Viagens de Gulliver”, e utilizado pelos personagens houyhnhnms para se referirem aos seres humanos, no País dos Houyhnhnms. Quer saber quem e o que são os houyhnhnms? Ah, ficaste curioso? Ótimo. Ou és sadio ou começas a se curar da doença. Leia o livro ou pesquise em fontes confiáveis, e saberás. Aliás, sabes o significado do nome de sua rua? É nome de pessoa? E já tiveste a curiosidade de saber quem foi a pessoa que dá nome à rua em que você mora?
O caminho para a cura é simples, mas não significa que seja desprovido de esforço pessoal. Deixar de ser uma anta depende de a própria anta desejar empreender um esforço mínimo (seguramente menor do que o Google) para ultrapassar a fase houyhnhnm e se transformar em um verdadeiro Yahoo. É tudo com você.
(Crônica publicada no jornal Informante, de Farroupilha, em 19 de agosto de 2011)

5 comentários:

Anônimo disse...

Hahaha muito bom! Eu até pensava em escrever um comentário mais digno, mas a anta anda de romances com o quati, aí acabaram levando a vaca para o brejo...

Hehehehe
J.Cataclism

Juliana disse...

Verdade!!
Durante algum tempo se imaginou que tal "mal" atacasse apenas mentes jovens, ainda em desenvolvimento, mas estudos comprovam que o mesmo está acometendo muitas cabeças, independentemente da idade. Os efeitos nocivos são majorados quando a pessoa infectada nega a "doença" e entende-se como dona da verdade, seja por conta da condição hierárquica que ocupa ou pela conta bancária que ostenta. Muito comum na região serrana do estado, hehehe!!

Página Virada disse...

Marcos,

Você tem razão quando escreve que a preguiça mental é um grande mal. Tenho observado como as pessoas são, em geral, pouco curiosas a respeito das coisas que as cercam. A única curiosidade que muitos têm é a de saber como vai terminar a novela (o que, convenhamos, não demanda mais do que a ligação de uns dois ou três neurônios), e besteiras do tipo.
Conhecer muitas coisas? Para quê? O melhor é ganhar dinheiro e acumular posses.

Um abraço
Guilherme

Blog da Cris disse...

Adorei o texto, ele fala do que vemos a toda hora e ninguém tinha falado antes, pelo menos de que eu tenha conhecimento. Ops, será que é um sintoma desde 'mal'?
Parabéns pelo texto e continue assim nos surpreendendo nas coisas simples desta vida.
Abraços
Cristina Moschen

Matthaeus disse...

A preguiça física também é um mal do século.