segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

I love me, yeah, yeah, yeah!

Descobri, ao longo de décadas de experiências e de reflexões pessoais sobre o que me acontece nessa trajetória aqui na Terra, que um dos segredos da felicidade na vida é a gente aprender a se contentar com aquilo que se tem e não se frustrar em demasia com o que não se tem. Vou dar um exemplo claro, utilizando a mim mesmo como modelo, como gosto tanto de fazer, se é que já não perceberam.
Sou um aficionado pelos Beatles, esses quatro músicos de Liverpool que, por sinal, foram justamente relembrados na última sexta-feira, dia 7 de fevereiro, pela passagem dos 50 anos da primeira aparição ao vivo do grupo na televisão dos Estados Unidos, fato que originou a beatlemania mundial e alçou a fama do conjunto a todas as partes do planeta. Encantam-me a música deles, a sonoridade dos arranjos, a competência na composição das letras, das melodias, do uso dos instrumentos, as harmonias vocais, a proposta artística e por aí afora. Zero à esquerda que sou na arte de produzir sons que não sejam os involuntários, eu poderia ser um frustrado de carteirinha por não saber tocar como os Beatles, por não conseguir cantar com a voz rasgada de John Lennon, por não conseguir compor canções encantadoras como as de Paul McCartney, por desconhecer o processo de criação de riffs de guitarra que caracterizou George Harrison, por não possuir sequer indícios do carisma de Ringo e de sua capacidade de, na maturidade, transformar-se em um competentíssimo compositor de música pop que seus anos enquanto Beatle sequer indicavam.
Mas não, nada disso me frustra. Primeiro, porque tenho o privilégio de possuir ouvidos que me permitem acessar suas músicas, e depois, por ter sido contemplado por um gosto estético que me proporciona apreciá-los dessa maneira que tanto me dá prazer. E tem mais. Apesar de não cantar como os Beatles, não tocar como os Beatles, não compor como os Beatles, não ter a fama e a fortuna dos Beatles, eu, pelo menos, tenho os gambitos iguais aos dos Beatles!

Não vou mostrar-lhes, leitores, vocês precisam se resignar a acreditar naquilo que escrevo aqui, mas lhes juro: tenho os gambitos dos Beatles! Minhas pernas são compridas, alvas, finas, secas, esqueléticas, iguais às de John, Paul, George e Ringo. Tivesse eu nascido em Liverpool no início dos anos 1940, vocês hoje talvez estivessem curtindo geniais composições da dupla Lennon/McKirstney. Só de sonhar isso, já me contento.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 8 de fevereiro de 2014) 

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