sexta-feira, 23 de maio de 2014

Sobre balanças e espelhos

Existe uma relação diretamente proporcional e estranhamente perversa entre dinheiro e peso. Mas ó, quando digo “peso”, estou me referindo exatamente a isso que a amiga leitora pensou: os quilinhos a mais que todos os dias pela manhã nos fazem querer jogar pela janela a balança caseira que compramos no hipermercado com a intenção secreta de praticarmos a tortura contra nós mesmos sempre que nela subimos.
O ódio que passamos a nutrir (eita verbo que veio a calhar no contexto!) pelas balancinhas deve-se ao fato de que elas encarnam na prática do dia-a-dia a mesma função que, nos contos de fada, desenvolve o espelho encantado da Madrasta da Branca-de-Neve. O espelho, assim como a balancinha, é desprovido do senso de diplomacia e, simplesmente, não mente, nem mesmo omite ou camufla. Você pergunta e ele pá: responde na lata. “Espelho, espelho meu, existe alguém no mundo mais bela do que eu?”, inquiria a vaidosa rainha/madrasta/bruxa má. E o espelho mandava: “Sim, Branca-de-Neve é a mais bonita”. A mesma coisa a balancinha, né, amiga. Você sobe nela pensando que só por ter evitado ontem o sétimo bombom da caixinha o panorama no visor da balancinha iria mudar para melhor e eis a surpresa: nananina... você aumentou 200 gramas. É brabo.
Só não arremessamos o inocente objeto pelo meio das persianas porque as persianas são caras e o rombo no capô da camionete do vizinho lá embaixo, ao ser atingida pela balança voadora, nos causaria semanas de incomodação e bate-boca, que fariam a delícia dos cochichos pelos corredores do condomínio, causando-nos um desgaste tão grande que chegaríamos a perder o apetite durante vários dias e... opa... perderíamos o apetite? Bom, então, até que talvez o arremesso da balança não seria uma ideia tão imbecil assim... Pensemos...

Mas eu dizia o que mesmo? Ah sim. A relação estranha entre dinheiro e peso. O que eu estava refletindo ontem pela manhã, eu e minha barriga em cima da balancinha, é que gastar calorias é um ato difícil, enquanto gastar dinheiro é tão fácil. E, no inverso da moeda, ganhar peso é tão fácil, mas ganhar dinheiro é tão trabalhoso. Por que diabos a equação não se inverte? Pergunto a quem: ao espelho ou à balancinha? Pensando bem, no meu atual estágio, melhor evitar o contato com ambos durante algum tempo...
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 23 de maio de 2014)

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