Sinceramente, a impressão que eu tenho é a de que, em algum ponto, há
algo errado. Pode ser que o erro, no fim das contas, sopesadas todas as
hipóteses, seja meu mesmo, e resida no fato de talvez eu não saber direcionar
direito as minhas expectativas. Afinal, é aquilo, né: não espere colher
melancia se o que você plantou foi abóbora. E também tem aquela outra, a máxima
do Barão de Itararé: de onde menos se espera, dali é que não sai nada, mesmo.
De qualquer forma, é impossível não detectar o florescer interno daquele arbusto
da decepção e da desesperança, quando o assunto é... tchan tchan tchan... a programação
da televisão paga!
Vamos aos exemplos, que são a forma mais prática e lúdica de representar
a tese que se pretende sustentar. Dia desses, no meio da semana, tirei o olhar
da tela do computador, em que desenvolvia um trabalho, e notei que a hora do
almoço se aproximava, célere. Junto a essa percepção, invadiu-me a fome, que
até então restava ali, domesticadinha, camuflada sob as ramagens da atenção
voltada ao labor. Saí do escritório que tenho em casa (meu “home office”,
chiquérrimo de mencionar) e rumei para a cozinha, determinado a fazer o almoço.
Mas, fazer o que, se na véspera não havia pensado em nada e não deixara nenhum
preparo encaminhado? Ora, aí lembrei que, recentemente, estreara na grade da
tevê por assinatura um canal exclusivamente dedicado à gastronomia e imaginei
que estaria ali a salvação de meu almoço. Bastaria ligar a tevê, sintonizar no
dito canal e acompanhar a programação, de onde pescaria alguma ideia salvadora,
apta a saciar o ardor famélico que excitava minhas papilas gustativas. Fi-lo, e
ralei-me.
Liguei a tevê, sintonizei no dito canal e, em pleno meio-dia, deparo com
que espécie de programação sendo exibida aos assinantes? Um leilão de joias!
Repito: leilão de joias, ao meio-dia, no canal de gastronomia! O errado só pode
ser eu, claro. Pepinamente errado, por esperar deparar com receitas, técnicas
culinárias, documentários gastronômicos, no dito canal de gastronomia. Mas não,
né! Ao meio-dia, claro, no canal de gastronomia, você vai assistir a um leilão
de joias, esperava o quê? Olha, eu bem que tento, mas assim fica difícil não
desligar a tevê e ir para a sala ler um livro (e depois dizem que a tevê não
incentiva a cultura). É o que tenho feito, há décadas, diariamente, por sinal. Ah,
e qual foi a salvação do almoço? Fácil: encontrei-a abrindo um livro de receitas
de uma das várias coleções que possuo sobre gastronomia. Todas desprovidas de anúncios
de joias...
(Crônica publicada no jornal "Pioneiro", de Caxias do Sul, em 5 de março de 2018)
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