“Bom dia, o que o senhor deseja?”, disparou por entre um largo sorriso a moça do balcão, assim que adentrei a loja. Travei na frente dela e fiquei girando a cabeça para a esquerda, para a direita e para trás, procurando com o olhar o suposto velhinho que deveria ter entrado no estabelecimento junto comigo e que, por uma questão de civilidade para com a terceira idade, recebia da funcionária a preferência das atenções. Porém, não havia ninguém ali além da atendente sorridente e eu. Era a mim mesmo, portanto, que ela dirigia não só o sorriso, mas especialmente o “bom dia” acompanhado do estapafúrdio “senhor”.
“Senhor, eu?”, espantei-me em pensamento, julgando, àquela altura de meus trinta anos, que tal forma de tratamento só deveria ser aplicada a pessoas com pelo menos uns 15 anos a mais do que eu. Certamente foi o mesmo pensamento que motivou a atendente, que não deveria ter mais do que 18 anos de idade e que, pelo exercício da mesma lógica, encontrava-se defronte a um já provecto cliente: minha pessoa. O fato deu-se há cerca de 15 anos, e não foi o primeiro a marcar (para não dizer traumatizar) as consequências inadministráveis da passagem dos anos sobre meu ser. O primeiro mesmo ocorreu não muito antes, quando eu exuberava meus 23 jovens anos pirilampeando por Santa Maria, e um menino de rua me abordou pedindo “Tio, me dá um troquinho?”... “Tio, eu???????”, espantei-me já daquela vez, até então habituado a desempenhar somente o papel de sobrinho.
Agora, a apenas dois passos dos 45, fui ao oculista e recebi receita para encomendar um óculos para a “vista cansada”. A partir da semana que vem, desfilarei pelos ambientes da casa com a cara aparafusada num daqueles oclinhos que se equilibram perigosamente na ponta do nariz quando enfiamos o rosto num livro ou na tela do computador, exatamente como faziam e fazem meus avós e meus pais e todos os que conheço que possuem 15 anos a mais do que eu: aqueles senhores e senhoras, aos quais, definitiva e inexoravelmente, me irmano. Com um par de óculos dessa espécie, não tem jeito, a idade passa a estar na cara.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 13 de maio de 2011)
“Senhor, eu?”, espantei-me em pensamento, julgando, àquela altura de meus trinta anos, que tal forma de tratamento só deveria ser aplicada a pessoas com pelo menos uns 15 anos a mais do que eu. Certamente foi o mesmo pensamento que motivou a atendente, que não deveria ter mais do que 18 anos de idade e que, pelo exercício da mesma lógica, encontrava-se defronte a um já provecto cliente: minha pessoa. O fato deu-se há cerca de 15 anos, e não foi o primeiro a marcar (para não dizer traumatizar) as consequências inadministráveis da passagem dos anos sobre meu ser. O primeiro mesmo ocorreu não muito antes, quando eu exuberava meus 23 jovens anos pirilampeando por Santa Maria, e um menino de rua me abordou pedindo “Tio, me dá um troquinho?”... “Tio, eu???????”, espantei-me já daquela vez, até então habituado a desempenhar somente o papel de sobrinho.
Agora, a apenas dois passos dos 45, fui ao oculista e recebi receita para encomendar um óculos para a “vista cansada”. A partir da semana que vem, desfilarei pelos ambientes da casa com a cara aparafusada num daqueles oclinhos que se equilibram perigosamente na ponta do nariz quando enfiamos o rosto num livro ou na tela do computador, exatamente como faziam e fazem meus avós e meus pais e todos os que conheço que possuem 15 anos a mais do que eu: aqueles senhores e senhoras, aos quais, definitiva e inexoravelmente, me irmano. Com um par de óculos dessa espécie, não tem jeito, a idade passa a estar na cara.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 13 de maio de 2011)
5 comentários:
Ah!, essa mania chate de "o senhor" e "a senhora"...
Uma propaganda de alguns anos atrás, da GVT, mostrava tudo.
É realmente interessante da forma que tu lembrou, pois segue aquilo que passa nos meus miolos quando vou ao mercado, por exemplo: a mocinha, que não deve ter lá mais do que dezessete ou dezoito anos, chamando um marmanjo de trinta de "senhor".
Sugiro extinção deste pronome ou forma de tratamento, o que for. Opa!, "nem tão ao exagero"...
:-)
J.Cataclism
É verdade, Cataclism, concordo contigo. Mas veja bem: nada está tão ruim que não possa piorar... daqui a algumas poucas décadas, já estarão nos chamando, no caixa do mercado, de "nono".....
...é, aí sim! Ao menos, uma vez sendo chamado de "nono", o cara tem aval total pra o esparadrapo segurando óculos e também vestir as cuecas por cima da camisa. Coisa fina.
:-)
J.Cataclism
Eu já me conformei...
Beijos,
Rafaela
E isso, Rafaela, que você ainda esta longe dos 40... hehehe
Bjs
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