sexta-feira, 31 de julho de 2015

Desfez-se a luz

Ontem, parte do meu mundo veio abaixo, caiu, ruiu, desmoronou, esfacelou-se. Uma crença que eu tinha arraigada no âmago de meu ser foi colocada por terra devido a uma informação que sempre ficara distante de meus domínios de conhecimento, sabe-se lá por quais artimanhas do Destino, essa entidade insondável e ardilosa. Depois disso, passo a engrossar e endossar as fileiras dos adeptos das teorias da conspiração, e contem comigo para afirmar que os atentados do 11 de Setembro foram armação dos próprios Estados Unidos; que o homem jamais pisou na Lua e tudo não passou de um truque de estúdio cinematográfico; que os gatos se comunicam telepaticamente entre si ao redor do planeta, detentores de uma rede de informações superior à internet; que Elvis Presley não morreu; que Barack Obama é, na verdade, um extraterrestre; que os discos da Xuxa, se tocados ao contrário, divulgam mensagens esquisitas, tudo isso e ainda mais, muito mais.
E tudo isso, e tanto mais, devido à aparentemente simples revelação de que os palitos de fósforo, na verdade, não contêm fósforo algum. Eles não são de fósforo, minha senhora, meu senhor, moços e moças. Está escrito na caixinha que os palitos são de fósforo, você adquire a caixinha crente de que ela está repleta de palitos de fósforo e, no entanto, não há neles fósforo algum. O fósforo, saibam aqueles que não sabiam, como eu, está, isso sim, incrustado é nas laterais da caixa, naquela faixa escura em que você risca o palito embusteiro. Não são palitos de fósforo, mas, sim, caixinhas fosforadas. Como pude passar quase meio século de existência seguro de que empunhava palitos de fósforo ao fazer fogo para acender a lareira que aqueceria os invernos ijuienses, para acender as churrasqueiras nos almoços de final de semana, para acender as velas nas quedas de luz que escureciam a cidade e abriam as estrelas do céu? Como?

O fósforo, então, reside é na tarja escura da caixinha, e a combustão do palito se dá devido ao atrito das substâncias químicas inseridas na sua cabeça (onde eu sempre jurei que residia o fósforo) contra o fósforo que está na tarja. Voilá! E fez-se a luz. Não que eu tenha ficado de cabeça quente frente a essa incendiária revelação, mas, pô, assim não dá para acreditar em nada, mesmo. A verdade é realmente uma fagulha fugaz de luz.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 31 de julho de 2015)

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