quinta-feira, 30 de julho de 2015

Olha a onda

Até alguns minutos antes de me botar a escrever estas linhas, eu tinha uma certeza a respeito de mim mesmo, que se transformaria no fio-condutor do texto de hoje. Depois de não muito pensar (pensar em demasia sempre dói), concluí que eu não sou uma pessoa que vai na onda dos modismos, e iria discorrer aqui a respeito de ondas e de modismos. Só que não.
O que me conduziu a essa rápida conclusão sobre mim mesmo (criatura rasa e banal, sou simples de decifrar) foi o fato de que eu não entrei nessa onda de adquirir os tais dos livros para colorir destinados ao passatempo de adultos, que tanto andam fazendo sucesso nas prateleiras das livrarias, onde desbancam das vitrines os outros livros, aqueles repletos de linhas impressas escritas por escritores, destinados à leitura por parte de leitores. “Não, não entrei nessa onda, porque não sou uma pessoa que entra em ondas”, raciocinei, e escreveria sobre isso. Mas raciocinei errado.
É verdade que não entrei na onda dos livros para colorir para adultos. Primeiro, porque não tenho caixa de lápis-de-cor desde que ingressei no Segundo Grau, e isso faz tanto tempo que nem se imaginava, na época, que Segundo Grau se transformaria em Ensino Médio séculos mais tarde. Décadas mais tarde, desculpem o exagero. Segundo, porque sou péssimo em colorir, isso ainda desde a época do Primeiro Grau, milênios atrás, e desculpem de novo. Mas isso são desculpas furadas, não entrei na onda porque achava que eu era uma pessoa que não entra em ondas, só que meu passado me condena. No início dos anos 1990, por exemplo, houve a onda de pendurar bonequinhos de pelúcia no espelho retrovisor dos veículos, que também podiam ser encontrados afixados com ventosas de plástico nos vidros laterais e traseiro dos carros. Trafegava-se pelas ruas deparando-se com Frajolas, Garfields e Piu-Pius balançando as cabeças dentro dos automóveis, sendo que, no meu, havia um rato cinza narigudo.

Então, é inverdade que eu não mergulho em ondas. Não posso escrever uma crônica afirmando isso. Somente nas ondas do mar eu não entro mesmo, por puro medo e respeito. Aproximo-me delas apenas quando já chegam mansas na beira da praia, transformadas em pequenas marolas. Só o que posso dizer sobre mim, portanto, é que sou chegado a marolas.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 30 de julho de 2015)

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