domingo, 14 de setembro de 2014

Coelho na cartola

“Temos de ganhar mais dinheiro”. Mesmo vivendo na minha Ijuí natal e tendo apenas 14 anos de idade, lá nos idos do início da década de 1980, eu e meu primo compartilhávamos na essência pelo menos um dos principais atributos dos habitantes da Serra Gaúcha, região que vim a habitar só muito tempo depois. Decidimos nos transformar em jovens empreendedores porque percebemos que os valores que cada um recebia de mesada dos respectivos pais não atendiam mais às nossas necessidades. Ele, porque queria mais grana para os lanches no recreio e eu porque desejava adquirir mais gibis de super-heróis.
Aquela situação não podia continuar. A Editora Abril estava lançando gibis próprios do Homem-Aranha e do Capitão América e eu simplesmente pre-ci-sa-va daquilo. Depois de conversarmos com um coleguinha que era filho de empresário rico, descobrimos que o segredo de sua fortuna residia na criação de coelhos que ele mantinha em uma de suas propriedades. Naqueles tempos politicamente incorretos, a pele de coelho andava valorizada no mercado da moda e aquilo nos pareceu um investimento promissor, afinal, coelhos se reproduzem como coelhos e bastaria investirmos em dois casais de matrizes para em breve vermos nossa criação duplicar, triplicar, quadruplicar, bem como nossos lucros e, com eles, os meus gibis do Homem-Aranha e os pastéis do meu primo.
Mãos à obra, bastava comprar os coelhos! Passamos uma tarde capinando um pedaço de terra nos fundos da casa onde minha família morava, a fim de construirmos ali o nosso futuro coelhódromo. Mas nosso empreendimento jamais avançou de um sonho tirado da cartola mágica da imaginação e de cinco metros quadrados de tiririca capinada nos fundos da nossa casa na Rua dos Viajantes. Isso porque jamais sobrou grana da mesada para adquirirmos os primeiros casais de coelhos. Afinal, havia gibis do Homem-Aranha todo o mês a serem comprados na Livraria Progresso e pastéis de carne a serem consumidos no barzinho do colégio na hora do recreio. Nunca sobrava para investir.

Foi assim que aprendi que coelhos, por si só, não fazem mágica. E que empreendedorismo não salta da cartola.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 13 de setembro de 2014)

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