terça-feira, 8 de setembro de 2015

Quando pinga na conta

Hoje a crônica vai ser daquele tipo “seção pegadinha”, você sabe como é? O amigo leitor, a estimada leitora, já foram submetidos a essa espécie tão comum de crônica antes? Não? Sim? Não lembram? Nem sabem do que eu estou falando? Bom, então, o negócio é seguir adiante e ver no que é que vai dar.
Crônica do tipo “pegadinha” é dessas que começam propondo uma questão ao leitor, a servir de gatilho para remetê-lo a um mergulho dentro dos meandros (“meandros” caiu aqui como uma luva) de sua própria memória. Por exemplo: “onde você estava quando morreu Ayrton Senna?”. Ou ainda: “o que você estava fazendo quando morreu Tancredo Neves?”. Opa, essa última aí não faz o menor sentido para leitores que não estavam fazendo absolutamente nada pelo simples fato de não terem sequer nascido à época do ocorrido, isso se supusermos a eventualidade de eu ter de fato leitores com menos de 30 anos de idade. Mas essa aqui é comum a todos: “onde você estava, com quem estava e o que pensou quando o Brasil levou sete a um da Alemanha na última Copa do Mundo?”. Han? Preferiu esquecer completamente o episódio? É, foi mal, essa aí não serve de bom exemplo para nada mesmo.
Bom, mas o leitor e a leitora já entenderam o espírito da coisa e podemos seguir em frente. O que eu queria era convidá-los a recordar o destino que deram ao primeiro salário que receberam em suas vidas de trabalhadores, uma vez que o que fazer com o salário, quando o temos, e quando (e se) ele pinga na conta, é uma das questões que mais andam apoquentando o cotidiano dos brasileiros nesses hodiernos tempos de crise (já o “hodiernos” ali foi odioso, admito). Você se lembra de seu primeiro salário e o que fez com ele? Eu me lembro.

Os idos eram o final dos anos 1980 e eu começava como repórter de um jornal diário em Santa Maria da Boca do Monte. Recebi o olerite (ahá, olerite!), conferi os cifrões que me cabiam e parti firme para a mais tradicional loja de calçados daquela região, onde adquiri dois pares de sapatos. Depois, corri até a livraria e comprei um manual completo sobre a arte da diagramação de jornais (investimento em aprimoramento profissional) e outro com reproduções luxuosas de telas do pintor Salvador Dalí. Foi em sapatos e livros que gastei meu primeiro ordenado. Artefatos que vêm guiando meus passos por estradas tanto tangíveis quanto imaginárias, ao longo da vida. De minha parte, creio que comecei investindo certo.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 8 de setembro de 2015)

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