sábado, 19 de setembro de 2015

Tempo não é dinheiro

Fico me perguntando: para que se botar a querer dizer algumas coisas, se há quem as diga muito melhor do que você jamais seria capaz de fazer? Foi o que pensei quando assisti esta semana, em uma rede social (gosto do jargão “em uma rede social”, porque fica assim, na indefinição, e ninguém sequer de longe imagina qual “rede” seria, o que é compreensível, haja vista a existência de redes que, devido a seu conteúdo, estão mais para antissociais do que qualquer outra coisa), quando assisti a um trecho de vídeo contendo um depoimento marcante que o então presidente do Uruguai, José Mujica (presidiu o país entre 2010 e 2015), concedeu a um documentário intitulado “Quebrando o tabu”. Assisti e parei para refletir.
Em vez de ficar aqui viajando na maionese, como é de lei nestas mal digitadas que mal digito diariamente, e quem me lê bem o sabe, decidi ceder o espaço à transcrição das palavras do estadista uruguaio, por achar que vale a pena. Assim sendo, lá vai Mujica:
 “A forma como vivemos, e também os nossos valores, são a expressão da sociedade na qual vivemos. E a gente se agarra a isso. Não digo isso por ser presidente do Uruguai hoje. Pensei muito sobre isso. Passei mais de dez anos na solitária. Tive tempo... Em sete anos, nem sequer li um livro. Tive muito tempo para pensar. E descobri o seguinte: ou você é feliz com pouco, com pouca parafernália, pois a felicidade está em você, ou não se consegue nada.
Isso não é a apologia da pobreza, mas da sobriedade. Só que inventamos uma sociedade de consumo, consumista, e a economia tem de crescer, porque, se não cresce, é ‘uma tragédia’. Inventamos uma montanha de consumos supérfluos, em que nos dedicamos a ficar comprando e descartando o tempo todo. Mas o que gastamos realmente é tempo de vida. Isso porque, quando eu ou você compramos algo, não o pagamos com dinheiro. Nós pagamos é com o tempo de vida que tivemos de gastar para obter aquele dinheiro. Mas tem um detalhe: a única coisa que não se pode comprar é a vida. Tudo se compra, menos a vida. A vida se gasta. E é lamentável gastar a vida para perder a liberdade”.

E ponto. Nada mais a dizer sobre aquilo que tão bem está dito.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 19 de setembro de 2015)

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