quinta-feira, 1 de agosto de 2013

A árvore era eu

Você já passou pela experiência de ter de desempenhar o papel de árvore no teatrinho da escola? Eu já. Foi horrível. Eu tinha uns sete ou oito anos, estava nas primeiras séries do (então) primeiro grau e a professora inventou de organizar um teatrinho como forma de ajudar no processo de desinibição da gurizada. Eu, que era um bosque de timidez, acabei naturalmente escalado para ser uma das árvores da floresta encantada, papel que, aos olhos da profe e de toda a turma, parecia me cair como uma luva.
Como uma luva de ferro, diga-se de passagem, pois fui um desastre no papel de árvore do bosque encantado. Éramos umas dez ou doze árvores naquele bosque, afinal, era preciso haver papeis para toda a turma e nem todos podiam ser o Príncipe ou a Bela Adormecida (agora fico pensando que rumo será que tomou na vida o Anderson, a quem tocou o papel de sapo?). Só que justamente a minha árvore tinha de falar algumas frases, pois, sabe-se lá por que astúcias do destino, coube a mim encarnar a líder do arvoredo mágico.
E quem disse que, no dia da apresentação, eu conseguia lembrar a fala, que nada mais era do que algo do tipo “Siga por esta estrada de tijolinhos, ó Príncipe, e ao final dela encontrarás o que procura”. Até que me vinham à mente as imagens da estrada de tijolinhos que uma cartolina amarela estendida no chão da sala imitava e a necessidade de o Príncipe (na verdade, o Eudes) passar por ela, mas as palavras não me vinham. Fosse eu um ator nato, teria me desvencilhado da sinuca mandando a porcaria daquele príncipe andar logo pela cartolina e fim de papo, usando as minhas próprias palavras (“pisa ali na cartolina, ó, tchê, e te some”), mas não, eu me atinha à decoreba que, tal qual a tabuada do sete, teimava em trair a minha memória.
Débora, a coleguinha árvore mais próxima de mim, salvou a parada e a peça, dizendo as minhas falas, que ela decorara melhor do que eu. Morreu ali na casca a minha promissora carreira hollywoodiana. Isso que, naquela época, eu já trazia na bagagem o sucesso de algumas performances desinibidas feitas anos antes, no jardim da infância, ao lado de meu primo Guilherme, quando ambos entretínhamos colegas e “tias” imitando o Gordo e o Magro. Detalhe: eu fazia o Gordo. De fato, algo não estava encaixando desde o início nessa coisa de dramaturgia pro meu lado. Quem disse que o destino erra sempre?

 (Crônica publicada no jornal Pioneiro em 1 de agosto de 2013)

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