sábado, 24 de agosto de 2013

Isto é o real

A realidade, às vezes, se desbarranca em nosso colo de maneira agressiva, como que para nos chacoalhar, fazer acordar, enxergar direito as coisas à nossa frente que, normalmente, parece que evitamos perceber ou aceitar. São os chamados choques de percepção, ou insights, como gostam de dizer os psicólogos. Eu já vou mais no raso e digo “soco no estômago”, mesmo.
Pois tive um clarão assim noite dessas, enquanto participava de um evento cultural realizado no anfiteatro da Câmara de Vereadores. A palestrante convidada para aquela data, professora renomada na cidade, ao iniciar sua fala, emendou um esclarecimento aos organizadores que lhe haviam feito o convite. Pediu desculpas por não ter acatado a sugestão de mobilizar seus alunos de ensino médio para comparecerem ao evento e explicou as razões, resumidas em dois tópicos: trânsito e segurança.
Lúcida e previdente, a palestrante julgou arriscado mobilizar pais e alunos para o evento, levando-se em conta que, para tanto, obrigaria as famílias a, primeiro, enfrentarem o estresse e a imprudência vigentes em nosso trânsito urbano especialmente no período do final da tarde e início da noite. Depois, avaliou a questão da segurança, ou melhor, da falta dela, ou mais explicitamente, da violência mesmo à qual estamos expostos à noite, na hora do encerramento da atividade. Quem se sente seguro? Melhor, portanto, poupar os alunos e suas famílias de terem de se submeter a esses riscos.
Refleti, ponderei, concordei e me preocupei. De fato, quantas vezes eu mesmo não tenho optado por recusar convites para eventos, ou evitado planejar idas a restaurantes, shows, atrações diversas, visitas e passeios, levando em conta exatamente esses dois fatores que têm tornado quase impeditiva a vida tranquila em sociedade hoje, o trânsito e a insegurança? Dirigir virou um caos. Encontrar vaga para estacionar, uma gincana. Agregam-se a isso os riscos de ser assaltado nas sinaleiras, ter o veículo roubado, enfrentar um revólver empunhado contra você e os seus por um assaltante visivelmente alterado.
Ficar em casa passa a ser, na maioria das vezes, a programação mais recomendável. E nem mesmo encastelados estamos cem por cento seguros. No entanto, por imposição legal, seguimos sendo obrigados a sazonalmente votar naqueles que ganham suas vidas prometendo melhorar uma situação que só piora a olhos vistos. Valeu, professora. Caiu a ficha.

 (Crônica publicada no jornal Pioneiro em 24 de agosto de 2013)

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