quinta-feira, 17 de julho de 2014

O botão principal

Nesses tempos pós-modernos, em que nosso cotidiano é cada vez mais adornado por quinquilharias eletrônicas de todos os calibres, tenho amadurecido a conclusão de que, entre todos os avanços tecnológicos que vejo surgirem desde o advento da torradeira elétrica, um dos que mais me encantam é o botão (e/ou a tecla) “desligar” (ou “off”) que acompanha todas essas engenhocas. A cada dia que passa, apaixono-me um pouco mais pelas teclas e botões “off” que me rodeiam.
É a tecla “off” do controle-remoto da televisão que me permite fazer a coisa certa sempre que a programação exibida começa a ofender meu senso do ridículo. Não penso duas vezes quando tem início a gritaria do programa de auditório dominical, ou as brigalhadas das telenovelas. Pressiono o botão e off nela! A um simples toque, a paz, a mansidão e a inteligência voltam a reinar nos domínios de minha sala de estar.
O mesmo acontece com as estações de rádio que sintonizo em busca de vida inteligente. A música fica ruim ou os comentários do comentarista começam a nivelar com o raso da alma humana? Off nele. Pronto, a poluição sonora é varrida como que em um toque de mágica de dentro das paredes de minha casa, do escritório, do automóvel, e volto a escutar o doce som do silêncio.
O telefone celular, esse aparelhinho criado para nos tornar dependentes da possibilidade de sermos contatados a qualquer hora do dia, felizmente também vem equipado com a fundamental teclinha. Sendo assim, não penso duas vezes e mando ver off no celular quando estou no cinema; off nele no teatro; off nele no casamento; off nele na reunião de trabalho e em vários outros momentos da jornada diária. Não tenho a obrigação de estar disponível 24 horas por dia. Off, off, off! Não podemos esquecer que quem ainda está no comando somos nós, seres humanos, e não os aparelhinhos que nos cercam. Lembram da luz elétrica? Há momentos em que a intimidade fica bem melhor quando a gente “off” no interruptor.
Reaprender a desligar pode ser a melhor maneira de nos religarmos com nossa essência humana. Desligar renova o silêncio e a privacidade. Desligar recarrega as baterias, restaura o bom-senso e a boa educação. Precisamos colocar a tecnologia dentro de seu devido lugar, provando a nós mesmos que não somos escravos dela, enquanto ainda é tempo. A primeira pergunta que faço aos vendedores nas lojas, antes de adquirir qualquer novo produto que funcione a bateria ou a eletricidade, é: “Onde se desliga esse troço?”.
Afinal, dormir ainda é o melhor remédio para sanar os males do espírito, do corpo e da alma. Que os eletronicotrecos saibam também obedecer à ordem de ir para a caminha, de vez em quando...

 (Crônica publicada no jornal Pioneiro em 17 de julho de 2014)

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