segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

Sob o reinado de Fébruo

Chegamos, chegamos, são todos bem-vindos, sentem-se, há lugar para todos. Entramos em fevereiro, o segundo mês do ano. Janeiro já é passado, recém ontem erguíamos as taças em brindes ao primeiro dia do novo ano, que agora empilha contas com reajustes, impostos anuais, novas safras de descalabros noticiados pela imprensa, cada brasileiro operando os milagres que precisa protagonizar para ir abrindo clareira dia a dia em meio à selva cerrada e às pedras que se acumulam no caminho, ano adentro. Lá vamos nós.
Bem-vindos, então, a fevereiro. Sacamos fora a folhinha de janeiro, o mês dedicado ao antigo deus romano Janus, aquele que tem duas faces e guarda os portões, olhando para o passado e para o futuro ao mesmo tempo e evoca os começos e os encerramentos. Olhamos agora para fevereiro, o mês cambiante que a cada quatro anos ganha um dia a mais (o último, o 29º), como neste 2016, transformado, assim, em ano bissexto porque terminará com 366 dias (“bissexto” = dupla de seis ao final). Fevereiro, o mês dedicado ao deus Fébruo (“Februs”, em latim), de quem ganha o nome, pois de Februs derivou, na forma latina, “februarius”, o mês dedicado a essa divindade.
Fébruo é um deus pouco conhecido na modernidade, bem menos lembrado do que Janus, talvez por não integrar o panteão oficial da deidade romana, mas ser uma entidade reverenciada pelos etruscos. Os etruscos eram um povo que habitava ampla região da Península Itálica e que foi absorvido pelo poderio de Roma por volta do século III antes de Cristo. Em sua mitologia própria, Fébruo era o deus que reinava sobre os processos de purificação. Daí a origem remota das festas carnavalescas, que derivam dos antigos rituais pagãos de purificação e renovação, todos dedicados a Fébruo, neste mês que o representa.

O Carnaval moderno se transformou em uma grande festa popular e seu significado purificador acabou se perdendo ao longo do passar dos séculos. Neste 9 de fevereiro, dia de Carnaval, talvez possamos, em meio à alegria da folia, dedicar alguns instantes para pensarmos seriamente nas purificações que andamos precisando fazer em várias esferas que nos cercam: na política, na convivência social, na urbanidade, nas relações interpessoais, nos nossos próprios atos e formas de vermos o mundo. Refletir um pouco nunca é demais, pois é daí que nascem as energias para os atos que podem transformar o que precisa ser transformado.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 1 de fevereiro de 2016)

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