Neste longo período de conflagração política que estamos
vivendo no Brasil, em que as ruas e praças das cidades são tomadas por grupos
defensores de facções diversas (inimigas, inconciliáveis e intolerantes entre
si), é interessante observar o alcance da imaturidade cívica que pontua a forma
de agir, de pensar, de se posicionar e de se expressar de certas parcelas dos
brasileiros, de lado a lado. Em que pese o fato louvável de os cidadãos
decidirem se desacorrentar da inércia do sofá da sala e irem às ruas manifestar
seus posicionamentos, ainda há muito a avançar em termos da civilidade
necessária para conduzir essas manifestações a caminhos que resultem de fato no
aprimorar da cidadania, da vida política e na conquista de melhores condições
de vida no país.
Em resumo, não é jogando pedras nos outros que vamos
convencer esses outros de que somos melhores ou diferentes do que eles, a quem
acusamos de justamente jogarem pedras. O entusiasmo do abraço à causa parece
levar certa parte dos brasileiros a esquecer que os fins nunca justificam os
meios e que a intolerância, a raiva, a agressividade, o ódio, a demonização
jamais servirão de alicerces para construir uma sociedade melhor, mais justa,
mais fraterna, menos corrupta. Jamais. Quem rouba não me representa. Quem
defende os que roubam não me representa. Mas quem prejulga também não me
representa. Quem coloca todos na vala comum não me representa. Quem quer
linchar o ladrão não me representa, porque está atropelando a seara das leis e
da Justiça. Quem quer linchar acusados de crimes antes mesmo de terem sido
julgados e quem não quer sequer escutar argumentos contrários não me representa.
Quem odeia não me representa.
O que parece é que os dois principais grupos estão
polarizados na adoção de antigas crenças populares (antagônicas entre si) que
reduzem o mundo à banalização das intenções. O Grupo A elegeu no Grupo B e seus
representantes a figura do Bode Expiatório, contra o qual pesa a
responsabilidade por todos os pecados do país. Acreditam que, sacrificando o Bode
e seus representantes, o paraíso se instalará na Terra como que por milagre. Já
o Grupo B idolatra a figura do Salvador da Pátria, que pode ser representado
por determinada(s) pessoa(s) ou instituições, por meio da(s) qual(ais) o
paraíso será conquistado. Ambos estão cegos e só passarão a enxergar a partir
do momento em que perceberem a necessidade de promover a autocrítica pessoal
interna, único caminho para a conquista da maturidade, da cidadania e da
construção de uma sociedade menos doente.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 2 de agosto de 2016)
Nenhum comentário:
Postar um comentário