sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Quem diria

Muito mais do que o futebol, caixinha de surpresas mesmo é a vida. “Vou morrer velho e não vou ver tudo” e “não há o que não haja” são expressões populares que resumem bem o sentimento de espanto que o fato de se estar vivo nos acomete com mais frequência do que somos capazes de admitir. Eu, que desembarquei nesse mundo há pouco menos de 50 anos, já acumulo centenas de episódios que me chegaram ao conhecimento (e/ou que presenciei) que são dignos de espanto. O interessante na coisa toda é que espanto é uma sensação que não se esgota jamais: sempre somos capazes de sermos surpreendidos pelo inesperado, por mais coisas que já tenham visto, vivido e sentido as nossas cãs.
Agora, por exemplo, Cuba e Estados Unidos organizando o restabelecimento de relações diplomáticas e comerciais, dando fim a um afastamento e a um embargo que duravam quase seis décadas. É a pedra derradeira que faltava para que se enterrasse definitivamente a Guerra Fria, cujo processo de caducança teve início ainda em 1989, com a queda do Muro de Berlim, seguida pelo efeito dominó da derrocada dos regimes comunistas do Leste Europeu. Quem diria que iríamos viver para presenciar isso...
Décadas atrás houve a libertação de Nelson Mandela, na África do Sul, antecipando o fim do apartheid, sistema segregacionista que oprimiu aquele país por décadas. Quem diria? Um papa renunciar e se retirar para a aposentadoria, como fez há pouco o Bento XVI... Quem diria? Mulheres conquistando o cargo de presidente em vários países do mundo; o fumo sendo banido dos espaços públicos; o álcool antes de dirigir sendo combatido; Bob Dylan gravando canções de Frank Sinatra; Plutão perdendo o status de planeta e depois sendo reabilitado; casamento homossexual sendo finalmente oficializado nos setores mais civilizados do planeta... Quem diria?

É por essas e outras que sigo tendo convicção de que ainda é válido lutar pelos sonhos e arregaçar as mangas para tentar mudar o que precisa ser mudado ao nosso redor. Sempre há muito por fazer, é verdade. Mas, felizmente, a vida e o mundo são elementos possíveis de serem transformados. A História que o diga.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 19 de dezembro de 2014)

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