sábado, 28 de novembro de 2015

Gentileza reumanizante

Vivemos em um mundo complexo, em que o ritmo acelerado do cotidiano procura acompanhar a velocidade das transformações sociais e tecnológicas, gerando estresse, correria, atropelos (metafóricos e reais). Ansiedade, afobamento, angústia acabam se impondo e gerando cansaço, prostração, frustração. Agenda lotada não é mais privilégio de altos executivos, mas, sim, um aspecto comum à vida de todos, desde crianças até idosos e aposentados. Quem foi que disse que 24 horas são suficientes para vencer as tarefas de um dia? Precisamos de clones, urgente!
É devido a esse cenário de exigências e superações diárias que procuramos criar e encontrar tábuas de salvação, rituais que nos possibilitem gerar pequenos oásis particulares nos quais reencontramos nossas essências, recarregamos as baterias físicas e psíquicas para reafirmarmos nossa condição humana (e não robótica) frente a nós mesmos. Procedimento vital e crucial para a manutenção ou recuperação da sanidade a fim de, claro, darmos sequência às demandas que já vão se acumulando de novo. É quando entram em cena os chamados “pequenos prazeres”. Em uma sociedade superlativa, em que o excesso vira sinônimo de prosperidade, pujança e felicidade questionável, vamos redescobrindo aos poucos o potencial de prazeres existentes nas chamadas pequenas coisas da vida, percebendo que atos singelos como dormir até mais tarde no final de semana ou servir o café da manhã na cama à cara-metade, surpreendendo-a, possuem um valor inestimável.

E estamos certos nisso. Só falta agora avançarmos um pouquinho, darmos o passo além, que também se faz necessário. Ao lado da (re)descoberta dos pequenos prazeres, que nos reumanizam individualmente, está na hora de nos dedicarmos um pouquinho também à prática das pequenas gentilezas cotidianas, atitudes que provocarão nossa reumanização coletiva, nos aproximando da essência do conceito de “sociedade civilizada”. O cumprimento ao vizinho no elevador, segurar a porta do estabelecimento para quem vem chegando, dar a vez ao outro no trânsito, parar frente à faixa de segurança, elogiar alguém pelo simples fato de apreciar esta pessoa, dar um presente por nada, reconhecer um erro, sorrir, agradecer, essas pequenas coisinhas que, quando executadas, nos tornam não grandes e nem maiores, mas nos colocam dentro da justa medida daquilo que somos, ou que deveríamos ser: humanos.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 28 de novembro de 2015)

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