quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Mas, porém...

Mas, conforme atestam os doutores em Língua Portuguesa, é equivocado iniciar uma oração com a palavra “porém”, porém, “porém” pode (e deve) ser utilizado somente no meio das mesmas, conforme fi-lo aqui nesta que abre esta crônica, na tentativa de fazê-lo certo, porque, de outra forma, iniciando esta com “porém”, entraria já no texto e na vida do estimado leitor e da amada leitora com o pé esquerdo, e eis que aqui surge uma metáfora porque é sabido que, por mais mundano que seja, o cronista não utiliza os pés para a produção destas linhas, mas, sim, as extremidades superiores, nas quais se espalham os dez dedos que dedilham o teclado na composição de parágrafos de tirar o fôlego até de leitores preparados e treinados na leitura de orações insubordinadas como a que finalmente agora chega ao final, sob pena de debandada geral, desmaios e ameaças de agressão física ao autor. Desculpo-me.
Aprendi que não se usa “porém” na abertura de uma oração (salvo as exceções de praxe, porque, o que seria da Língua Portuguesa se não fossem as exceções de praxe, hein?) lendo um livro do professor, jornalista e ensaísta gaúcho José Hildebrando Dacanal, uma sumidade em questões gramaticais (entre outras). O livro intitula-se “Manual de Pontuação – Teoria e Prática”, no qual o autor discorre sobre conceitos e regras gerais relativos à arte e ao ofício de bem escrever (um cronista que se pretende mundano precisa estar em constante processo de formação). Paralelamente aos conceitos, aos exemplos práticos e aos exercícios propostos, Dacanal vai brindando o leitor com pertinazes reflexões a respeito da degenerescência que detecta na qualidade da escrita verificável hoje em livros, jornais, revistas e outros impressos.

Afirma ele que a queda da qualidade da escrita no Brasil é um dos mais significativos sinais do processo de decadência da sociedade como um todo. Essa decadência, segundo ele, pode ser comprovada pelo crescimento das desigualdades sociais, da miséria, do crime e pelo afrouxamento das regras de convivência social e de comportamento moral. Finaliza: “...se todas as normas e todos os limites parecem ter sido abolidos e a desordem e a barbárie avançam incontidas, que importância podem ter as velhas regras do bem falar, do bem escrever e do bem pontuar”? Pois é. Nunca antes saber aplicar corretamente o “porém” foi tão significativo e relevante.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 18 de novembro de 2015)

Nenhum comentário: