quarta-feira, 5 de novembro de 2014

As sombras de Suzane e Raquel

Vai virar filme a história de vida de Suzane Von Richthofen, a bonita loira paulista de classe média alta que, em outubro de 2002, arquitetou o assassinato dos seus próprios pais, crime que foi cometido com crueldade pelo seu namorado e o irmão dele, dupla que ficou conhecida como Os Irmãos Cravinhos. Suzane, a exemplo dos Cravinhos, cumpre longa pena na cadeia, mas vem figurando constantemente na imprensa, pois seus atos seguem chamando a atenção.
Agora, vai virar filme e, provavelmente, sua história vai lotar as salas de cinema em todo o país, evocando o mesmo sucesso obtido anos atrás quando a atriz Deborah Secco interpretou nas telonas a biografia da ex-prostituta de luxo e blogueira Raquel Pacheco, a Bruna Surfistinha. O que elas têm em comum que atrai como um irresistível ímã a atenção de todos nós aos detalhes de suas trajetórias e de suas psiquês? Nesses dois casos específicos, Raquel e Suzane convergem em um aspecto crucial: ambas são belas moças provenientes de famílias de classe média, das quais o senso comum espera que sigam vidas consideradas “normais” e “socialmente aceitáveis”, cursando faculdade, virando profissionais de carreira, mães de família.
Em algum momento, no entanto, ambas resolvem protagonizar uma guinada decisiva para caminhos distintos e inesperados, ao menos, para a maioria das pessoas inseridas nas mesmas condições de vida que elas. Uma, opta pelo crime bárbaro; a outra, pelo mergulho no mundo da prostituição, sem que, aparentemente, precisassem optar por isso. Por quê? Aí é que está. A resposta não é simples e jamais consegue satisfazer o tamanho do mistério que segue existindo.

Procuramos nelas os pontos de convergência junto a nossos lados obscuros, da mesma forma como tentamos nos identificar com nossos ídolos positivos. Em que aspectos existem pedaços de mim na maldade de Suzane ou na transgressão de Raquel? O fascínio reside nessa busca inconsciente (ou consciente) por essas respostas. Elas acabam purgando as sombras que carregamos conosco e que (felizmente) não ousamos concretizar.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 5 de novembro de 2014)

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