Eu até que tentei, e juro que
tentei, escrever hoje sobre outro tema, variar o assunto, o enfoque, a
abordagem, mas não teve jeito, não consegui. Fazer o que se, aqui pela Serra,
“só se fala em outra coisa”, como diz a tia de um amigo meu? Não tem como
escapar: o assunto da hora é o frio e ponto. Ninguém escapa do frio em si e,
por tabela, não há como escapar de comentar sobre ele com todos, o tempo todo.
Até porque, do jeito como ele está irado (o frio), se faz notar o tempo todo,
em cada centímetro de nosso corpo, por mais agasalhados que estejamos. Sendo
assim, nevada leitora, ártico leitor, falemos de frio.
Meus dedos gelados arremessam
contra as teclas do notebook onde diariamente procuro enfileirar estas mal digitadas
linhas e, a cada toque, um ai! Um “ai!” de frio, resultante do contato, mesmo
que efêmero, da ponta do dedo (repleta de terminais nervosos) com a frieza
morta da tecla, na qual a baixa temperatura repousa, pronta para cravejar-me de
microscópicas estalagmites pontiagudas que penetram meu corpo pela extremidade
afinada da mão e vão se instalando por completo. É frio. Mais e mais frio. Ele
vem, ele sobe, ele me vai possuindo e dominando e só penso nele, em como
desejaria que sumisse de vez. Sim, tem sol hoje lá fora, o dia está até bonito,
claro, iluminado. Só que frio. Barbaridade, tchê, que frio!
Externo minha reclamação e
alguém me aconselha a enfileirar pensamentos calorosos, a fim de combater a
sensação térmica psiquicamente e, assim, fazer com que ondas de calor invadam
meu ser e me tragam de volta o equilíbrio. Tento, então. Começo pensando em um
fogão a lenha. Aceso. Agora, eu enfiando a mão dentro do fogão aceso. O braço.
Os dois braços. Começo a tentar entrar todo e... Bom, aí a coisa fica bizarra.
Apaga tudo. Penso no sol. Adianta pouco, pois, como já disse, há sol e, mesmo
assim, faz um frio de renguear cusco. Penso então em uma sopa quente. De
capeletti. Seguida por outro prato de sopa de agnoline. Começa a esquentar. Uma
dose de graspa, para acompanhar. Está funcionando. Pensarei em mais coisas
quentes. O Inferno de Dante. Um camelo comendo cebolitos no deserto do Saara
(não, isso dá é sede). Um prato de feijoada regado a pimenta malagueta. Luvas.
Toucas. Cachecóis. Estufas. Gatos enrodilhados nas pernas. Sauna a vapor. Sauna
seca. Sorvete de creme. Paletas mexicanas... Opa! Paletas mexicanas? Droga, esfriou
de novo, não dá para descuidar.
Recebo um telefonema. Entre
outros assuntos, vem no embalo o informe de que a temperatura ficará abaixo de
zero na sexta-feira. Deponho as armas. Amanhã, falarei de outra coisa.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 8 de junho de 2016)
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