Somos, nós, seres humanos,
movidos e motivados, muitas vezes, por impulsos e pulsões que nem mesmo nós
conhecemos claramente. Essas forças psíquicas tanto nos fazem agir, tomar
atitudes, quanto comandam nossas reações aos estímulos externos. E nem sempre
elas têm nome, ou uma face reconhecível. Na maioria das vezes, na verdade,
gostam de se manter quietinhas na sombra, ali, na moita do indecifrável jardim
de nossas personalidades. Mas, mesmo que aparentemente discretas, elas estão
ativas, positivamente operantes, quer queiramos ou não, quer as reconheçamos ou
não. Daí as surpresas (e também os sustos) que às vezes temos frente a nós
mesmos.
Exemplo disso pode vir quando
nos questionamos (ou quando somos questionados) a respeito de quais as energias,
ou sensações, ou sentimentos, que movimentam as mais poderosas forças de nosso
ser? Em outras palavras, o que nos move? Da mesma forma, qual é o caminho para
melhor atingir nossos corações? Qual a chave? Cada um tem uma, decorrente de
sua própria personalidade, das experiências que vivenciou e da maneira como
enfrentou e trabalhou essas experiências. Mas temos consciência disso? Ou seguimos
agindo comandados pelo impulso inconsciente e ainda obscuro dessas motivações,
sem sabermos nunca as razões pelas quais agimos de determinadas maneiras, nos
aproximamos e nos afastamos de determinadas pessoas, fazemos certas coisas e
deixamos de fazer outras, nos apaixonamos e desapaixonamos? O que somos? Quem
somos? Por que somos assim? Ah, mistérios insondáveis da alma humana...
O escritor britânico Somerset
Maugham (1874 – 1966) passeia pela questão em algumas linhas de seu romance
“Servidão Humana”: “Não sei o que faz os outros amarem a gente, mas seja o que
for, é a única coisa que importa e, quando ela não existe, não a podemos criar
com bondade, generosidade ou coisa que o valha”. Ou seja, a força que desperta
em alguém o sentimento de amor por nós é inescrutável e, se ela não existe no
coração dessa pessoa por si mesma, não há o que se possa fazer deliberadamente
para forçar seu surgimento. Machado de Assis (1839 – 1908) abordou o mesmo
problema, de forma diversa, em seu conto “A Chave”, em que o enamorado Luís
Bastinhos salva a linda Marcelina de um afogamento, mas isso não basta para
abrir as portas do coração dela a ele. Só mais tarde, ao mostrar-se um exímio
dançarino em um baile, é que o coração dela o acolhe. Conclui o autor: “a
verdadeira chave do coração de Marcelina não era a gratidão, mas a
coreografia”.
Pois, então, eis a questão: qual
é a chave do seu coração?
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 19 de abril de 2016)
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