sexta-feira, 8 de abril de 2016

Hora de rever os estoques

Quanto mais vamos convivendo conosco, mais vamos aprendendo nuances sobre nós mesmos. Incrível isso, não? Eu, por exemplo. Vira e mexe descubro aspectos sobre mim mesmo que, até o momento da revelação (“insight”, diria minha psicóloga, tivesse eu uma), me eram obscuros. E, aí, fico surpreso. Dia desses, só para dar um exemplo (e, por meio desse exemplo, tecer uma crônica, vá lá, confesso), me dei conta de que sou uma pessoa que gosta de lidar com estoques.
É. Isso aí. Estoques. Fico até tentado a imaginar que, não tivesse enveredado de cabeça nas áreas do jornalismo e da escrita, eu poderia me dar bem no cargo de gerente de estoques. De preferência, de um supermercado, pois que adoro perambular pelos corredores de supermercados. De planilha em punho e os olhos bem abertos, percorreria as gôndolas, pararia defronte a uma delas e ditaria ao meu ajudante (sim, pois, se é para ser gerente de estoques, eu quero que haja subordinados às minhas ordens, porque, sem poder mandar, não teria graça nenhuma): “anota aí, Geofredo, os ovos estão no fim; contate as galinhas e encomende mais ovos”. Nada de ser pego desprevenido. A falta de ovos jamais me deixaria com as calças na mão.
Aqui em casa, eu sou o rei dos estoques. Estou sempre atento a tudo e procuro não deixar faltar nada. Tenho estoque de manteiga na geladeira, pois, se acabar a manteiga que está em uso, não preciso sair correndo atrás de manteiga, já que tenho duas embalagens de reserva prontas para uso. Tenho estoque de creme dental, de sabonete, de papel A4, de feijão em caixinha, de tinta para impressora, de clipes, de café em pó e granulado, de ideias para crônicas, de livros para ler, de filmes para assistir, de xampu, de bloquinhos de anotação, de protetores auriculares, de calorias a serem gastas, de bobagens a serem ditas, de piadinhas repetitivas e sem graça, de fome, de gula, de óleo de oliva...

Só não tenho estoque de tempo. E nem de dinheiro. O que é óbvio e redundante, porque, se tempo é mesmo dinheiro, ao não possuir estoque de um, automaticamente, não possuo do outro. Devo ter parentesco com formigas em minha árvore genealógica, já que, com elas, compartilho essa mania de estocar. Ou, o que é mais provável, tudo não passa de apenas mais uma manifestação de minha característica ansiedade. Sou ansioso. Por isso, estoco. Nesses tempos conturbados que vivemos, seria interessante passar a estocar lucidez, paz, mansidão, tranquilidade, silêncios. Pode vir a ser útil. Vou pensar nisso.
(Crônica publicada no jornal Pioneiro em 8 de abril de 2016)

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